Quando nasceu, há 16 anos, Pedro não piscava. A mãe percebeu algo errado, mas só teve o diagnóstico preciso dois meses depois: Síndrome de Charge. Entre os problemas associados estão cardiopatias, perda auditiva e visual e atraso no desenvolvimento. Pedro tem todos os sintomas, em especial a surdez severa e problemas na visão e na fala. A condição, entretanto, não o impediu de desenvolver a criatividade artística e expressar seu amor pelos animais. Os desenho digitais estão na internet, onde o garoto, que também é autista, já faz sucesso e disponibiliza as obras para venda.
A página no Instagram tem 13 mil seguidores e foi criada pela mãe em janeiro de 2020, depois que algumas pessoas pediram para adquirir as obras. “Eu não dava muito bola no começo, mas depois que me pediram pra comprar um desenho, percebi que era uma arte, um dom dele”, diz a mãe, Sybelle Rosa.
Ela então imprimiu e emoldurou algumas obras do jovem, que serviram de decoração para o aniversário, e passou a divulgá-las na internet. “As pessoas gostam muito, elogiam, algumas compram ou querem encomendas, mas tudo tem que ser no tempo dele. Ele faz quando tem vontade. Tem dias que passa o dia todo desenhando. Em outros, não quer fazer nenhum”, conta Sybelle, lembrando que o filho também faz desenhos no papel.
Pedro começou a desenhar aos 7 anos, quando pediu um computador para a mãe, que fez a compra de uma máquina usada. "Usamos pendrive pois precisa trocar a memória." Os dois moram sozinhos em Várzea Grande, no Mato Grosso.
A artista visual Katia Velo, especialista em História da Arte e diretora da Associação Profissional dos Artistas Plásticos do Paraná (APAP/PR) destaca que a arte está ligada à sensibilidade. “O processo muitas vezes é mais relevante do que o resultado. O jovem Pedro demonstra afeto pelos animais e uma grande habilidade para realizar reproduções digitais. Não é incomum que pessoas com algum tipo de dificuldade ou deficiência realizem ótimos trabalhos artísticos”, percebe.
A venda dos quadros de Pedro, porém, ainda não consegue pagar as despesas com o tratamento adequado ao garoto. “Nós dependemos do SUS e agora com a pandemia parou tudo. Ele não consegue nem ir pra escola, pois não tem uma técnica de educação especial e pela internet ele não consegue acompanhar”, revela a mãe.
Ela conta que largou o emprego para cuidar exclusivamente do filho. "Com 6 meses, ele pesava apenas 3 quilos. Andou e teve o primeiro dente com dois anos e quatro meses apenas. Não sentava. Precisou passar por uma cirurgia no coração e implante de uma válvula. Foram 15 dias na UTI”, lembra.
Atualmente, Pedro precisa voltar para os tratamentos. “Precisamos de um novo aparelho auditivo, consultas, tratamentos e terapias, que são caros e oferecidos apenas em Cuiabá. Só que o Pedro não consegue entrar no ônibus, ele tem crises, então fica ainda mais difícil sem carro”, ressalta Sybelle.
Para auxiliar com as despesas, foi criada uma vaquinha virtual, pela qual é possível fazer doações de qualquer valor para ajudar no tratamento do Pedro. Para conhecer os quadros e adquirir as obras, conheça a página com seus desenhos digitais.
Descrita no fim da década de 70, a Síndrome de Charge é uma condição genética rara que atinge 1 a cada 10 mil recém-nascidos. Ela apresenta algumas características específicas, como:
• C: coloboma do olho, também chamado de 'olho de gato', uma má formação na pálpebra ou íris;
• H: defeitos cardíacos (heart defects);
• A: atresia das coanas nasais, um bloqueio de osso ou tecido do canal nasal (coanas), desde a parte posterior do nariz até à garganta;
• R: retardo do crescimento e/ou desenvolvimento;
• G: anormalidades genitais e/ou urinárias (genital and/or urinary abnormalities);
• E: anormalidades da orelha e surdez (ear abnormalities and deafness).
“Há várias outras anomalias que podem estar associadas como fissura palatal, alteração esofágica, paralisia facial, malformações de sistema nervoso central”, aponta a médica geneticista Josiane de Souza, do Ambulatório de Doenças Raras do Hospital Infantil Pequeno Príncipe.
Ela afirma que a gravidade da síndrome depende do tipo de má formação. “Alguns pacientes têm como principal limitação o problema cardíaco, outros o respiratório, outros o genital e outros o déficit intelectual ou crises convulsivas. Há diversos graus de acometimento, e não conseguimos medir, vai depender da evolução. Em uma mesma família com a mesma mutação, alguns indivíduos têm pouquíssimos sintomas e outros têm várias malformações. Isso é chamado de expressão variável”, explica a geneticista.
O tratamento, que pode incluir cirurgias, depende das alterações observadas em cada paciente. “Todos devem ser encaminhados a estimulação precoce; avaliação com neuropediatra pela possibilidade de atraso de desenvolvimento e crises convulsivas; avaliação com endocrinologista pela possibilidade de hipogonadismo e déficit de crescimento; avaliação com otorrinolaringologista pela possibilidade de atresia de coanas e perda auditiva; avaliação com geneticista para indicação de testes genéticos para diagnóstico e avaliação de risco de recorrência familiar.”
Os cuidados podem incluir medicamentos contínuos para déficits hormonais, anticonvulsivantes e controladores de comportamento, observa a médica.
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