Tuesday, September 7, 2021

Descolonizar os nossos olhares é requisito essencial para termos um país mais justo e igual, diz psicanalista

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Estávamos assistindo a um programa de TV sobre ciências quando os apresentadores contaram uma história sobre a busca que os espanhóis fizeram, na época da colonização, por ouro e pedras preciosas. A narração era mais ou menos assim: “Eles descobriram que havia ouro e pedras preciosas em vários lugares e, por isso, enviaram navios e homens e conquistaram muitos países”. Quase engasguei com a água que estava bebendo. Os meus filhos seguiam atentos, enquanto eu controlava a enxurrada de palavrões que tomava a minha mente. Respirei fundo.

Pais tiraram a criança de escola na Austrália porque acharam que as leituras sobre fluidez de gênero não eram apropriadas (Foto: Lina Kivaka/ Pexels)

 

Na realidade, eles não conquistaram nada. Invadiram terras, roubaram o ouro e as pedras preciosas como se fossem deles e escravizaram e mataram muitos nativos. Como já conversamos algumas vezes sobre a história do Brasil, ambos lembraram, imediatamente, dos indígenas e africanos. “É verdade, mãe, desse jeito que eles estão contando parece que foi tudo tranquilo e bonitinho, mas não foi. A história é bem mais triste, né?”

Há um ditado africano que diz que, enquanto o leão não aprender a falar, a história contada sempre glorificará o caçador. Por anos e anos, a história foi narrada pelo caçador, não porque a caça não sabia falar, mas porque nunca lhe deram ouvidos. Lembro das aulas de história e da forma quase romântica com que a invasão – não conquista – dos colonizadores era narrada. A escravidão falada como algo distante e que não trouxesse consequências nefastas para o país. A abolição como uma benesse da santa Princesa Isabel.
 

 

“Olhe para a realidade com olhos menos iludidos”
Elisama Santos

 

Eugenia e branqueamento da população como miscigenação e uma iludida democracia racial. Não, eu não estou dizendo que você deve descrever as violências que baseiam a história do nosso país, com riqueza de detalhes, para os pequenos de 5 anos. Estou pedindo, apenas, que olhe para a realidade com olhos menos iludidos. Que questione a história da forma que lhe foi contada. Que pegue o livro didático pedido pela escola e veja como a criança e o adolescente estão aprendendo a ler o mundo. Descolonizar os nossos olhares é requisito essencial para termos um país mais justo e igual.

A forma como narramos a história intefere diretamente nas emoções e inquietações que ela provoca em nós. O que aprendemos sobre a realidade direciona os nossos sentimentos e atitudes a respeito dela.

O Brasil é um país mal resolvido com as suas questões mais difíceis e profundas e, para solucioná-las, precisamos parar de empurrar a sujeira para debaixo do tapete. Precisamos ampliar as nossas visões, questionar o que até agora era inquestionável.

Como disse meu filho Miguel, a história é bem mais triste. Negar essa verdade não vai deixá-la melhor, tampouco diminuir as suas consequências. Saber disso faz com que tenhamos mais cuidado e atenção para que ela não se repita. Que as nossas crianças aprendam a ter mais senso crítico do que nós. Tenho fé que um dia chegaremos lá.
 

Elisama Santos é psicanalista, educadora parental, escritora, palestrante, mãe de Miguel, 8 anos, e Helena, 6 (Foto: Divulgação)

 

 



from Crescer https://revistacrescer.globo.com/Colunistas/Elisama-Santos-Entre-lacos/noticia/2021/09/descolonizar-os-nossos-olhares-e-requisito-essencial-para-termos-um-pais-mais-justo-e-igual-diz-psicanalista.html

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