Uma terapia realizada com bebês que apresentavam sinais precoces de autismo reduziu significativamente a probabilidade de um diagnóstico positivo para o transtorno na primeira infância. Foi o que revelaram pesquisadores da Universidade de Manchester, na Inglaterra, e do Instituto Telethon Kids Institute, na Austrália.
Publicado no jornal acadêmico JAMA Pediatrics, o estudo apontou que bebês tratados com a terapia conhecida como iBASIS-VIPP tinham dois terços menos probabilidade de serem diagnosticados com autismo aos três anos. O estudo se baseia em um trabalho anterior, que foi liderado pelo pesquisador Jonathan Green, da Universidade de Manchester. "Essas descobertas são a primeira evidência de que uma intervenção preventiva com os bebês pode levar a uma melhora tão significativa no desenvolvimento social que eles ficam abaixo do patamar para um diagnóstico clínico de autismo aos 3 anos de idade", apontou Green.
De acordo com o cientista, muitas terapias para o autismo tentaram focar em substituir as diferenças de comportamentos dos bebês por comportamentos mais "típicos". "Em contraste, a iBASIS-VIPP trabalha com as diferenças únicas de cada criança e cria um ambiente social em torno dos pequenos que os ajuda a aprender da maneira que for melhor para eles", afirma o pesquisador.
A terapia iBASIS-VIPP busca filmar a criança com os primeiros sinais de ter o autismo. Os pais, então, assistem aos vídeos dos seus filhos com um profissional para discutir as melhores maneiras de ajudá-los a se desenvolver. Dessa forma, é possível identificar os pontos fortes dos pequenos e usá-los com base para o seu desenvolvimento. Segundo Green, as crianças que estavam abaixo do patamar para o diagnóstico para autismo ainda tinham dificuldades de desenvolvimento, porém, ao trabalhar as diferenças únicas de cada criança, em vez de tentar combatê-las, a terapia apoiou efetivamente o desenvolvimento dos bebês em seus primeiros anos de vida. “Com esta terapia, estamos fornecendo suporte antes que o diagnóstico seja dado", diz.
Ao longo de quatro anos, os ensaios clínicos envolveram 103 bebês com idades entre 9 a 14 meses. O intuito dos pesquisadores foi investigar os impactos da terapia nas crianças. Todos os bebês mostraram sinais comportamentais precoces de autismo. Ao longo de um período de cinco meses, metade recebeu a intervenção, enquanto um grupo de controle recebeu o tratamento das melhores práticas atuais. Além disso, 89 crianças completaram uma avaliação no início do estudo, no final do período de terapia e quando tinham dois e três anos de idade.
O professor Andrew Whitehouse, que também liderou o estudo, ressaltou que devido à alta prevalência do autismo em todo o mundo, as descobertas desse estudo são extremamente importantes. “O autismo não é tipicamente diagnosticado até os três anos de idade, no entanto, as intervenções iniciadas durante os primeiros dois anos de vida, quando os primeiros sinais de diferença de desenvolvimento são observados e o cérebro está se desenvolvendo rapidamente, podem levar a um impacto ainda maior nos resultados de desenvolvimento em infância posterior ”, disse Whitehouse.
Opinião de especialista
O professor e pesquisador do departamento de pediatra e medicina molecular da Universidade da Califórnia em San Diego (EUA), Alysson Muotri, que não participou do estudo, explica que a iBASIS-VIPP é uma espécia de terapia intensiva de ABA, Análise do Comportamento Aplicada, colocada em prática pelos pais com a orientação remota de especialistas. "Os pais enviam vídeos das interações com os bebês para os profissionais e eles dão orientações de como agir para estimular ao máximo as habilidades desejadas em cada situação, mesmo que seja uma brincadeira", afirma Muotri. "Pode ser recomendado para todos os bebês que demonstram sintomas precoces de autismo, pois não tem contra-indicação".
Muotri ressalta, porém, que o número de bebês que participaram do estudo ainda é baixo e são necessárias mais pesquisas para ter efeito estatístico confiável. "No entanto, existem outras evidências cientificas que, em conjunto com essa, apoiam esse tipo de terapia precoce", afirmou o pesquisador. "E não deve ser só para autismo, mas também pode funcionar em síndromes do neurodesenvolvimento. Por examplo, um trabalho usando um modelo de roedor para síndrome de Rett, mostrou que esse tipo de estimulo antes dos sintomas também ameniza a severidade do caso. Outro ponto ainda a ser estudado é o efeito a longo prazo. Será que esse tipo de terapia reduz também os sintomas no individuo adulto? Eu acredito que possa ser possível, mas isso é extremamente difícil de ser estudado".
from Crescer https://revistacrescer.globo.com/Bebes/Saude/noticia/2021/09/terapia-precoce-com-bebes-aumenta-desenvolvimento-social-e-reduz-diagnostico-de-autismo-aponta-estudo.html