Antes de começar este texto, quero fazer um hedge para garantir amor eterno do pai do João e do Pedro: o meu marido é o melhor pai do mundo. Pronto, voltamos à programação normal. Quem me conhece sabe que não existe a possibilidade de eu não tirar sarro ou levar com ironia as situações mais complexas e de pressão pelas quais passo. Ainda bem que nada disso mudou com a maternidade, pelo contrário: tem dias que me sinto especialmente inspirada.
Tipo no dia em que eu recebi uma mensagem de um conhecido de uma conhecida (vai vendo a falta de intimidade), dizendo que tinha cruzado com André [Rizek] e os gêmeos passeando cedinho para o banho de sol, num sábado de folga, e ele pensou "que pai legal dar um descanso para a mamãe". Que fofo o pai, né? Foi passear com os próprios filhos num sábado de manhã para a mãe poder tomar café com uns 10 minutos a mais dos tradicionais 10 minutos diários e, se der sorte, ainda consegue lavar o cabelo que estava pedindo fazia alguns dias.
Eu sei que a pessoa não fez por mal, mas me deu uma raiva aquela mensagem, achei tão machista. Nunca ganhei parabéns de desconhecidos por amamentar meus bebês gêmeos, tampouco recebi um certificado de melhor mãe do mundo por acalmá-los quando a tarefa parecia impossível e eu estava caindo de sono.
A mensagem do “desconhecido íntimo” me fez lembrar o dia em que fui ao médico pela primeira vez após a cesariana, com muita dor e desconforto, para ser examinada 40 dias após o nascimento dos meninos. Uma senhora me reconheceu e perguntou como eu "já" estava na rua sem os gêmeos. Será que, André, quando vai ao dentista também é questionado sobre a localização dos meninos? Certeza absoluta que não.
Dia desses abri uma caixinha de pergunta no stories e fiquei chocada com a quantidade de comentários de mães sobre o pai que não ''ajuda''. Gente, sério: sei que parece um assunto já démodé, muito batido, mas não é: precisamos repetir à exaustão, até que se esgote essa ideia machista, patriarcal e injusta de que ao pai cabe "ajudar". Não, fofo: você é tão pai como eu sou mãe, não tem que nos "dar uma mãozinha": é corpo, braço, pé, cabeça, coração e alma tudo junto e misturado.
Citei ironia porque outro dia brinquei com André que, ao trocar a fralda de um dos meninos, ele chamou minha atenção para o fato: "Olha, amor! Você viu a quantidade de cocô que tinha aqui nessa fralda que eu troquei?" "Maravilhoso, amor!", reagi, terminando de botar o outro filho para arrotar. Diante da minha reação normal a um fato cotidiano, ele dobrou a meta: "Mas você nem prestou atenção direito! Olha isso". Eu, que não perco a piada por nada, não aguentei e sugeri, então, um prêmio: "amor, que máximo! Vou providenciar a medalha de honra ao mérito!" Caímos na gargalhada, óbvio. Mas acho que ter dado essa conotação exagerada a um evento banal da maternidade ajuda a dar a dimensão de como, para nós, mães, das mais experientes às novatas, o que importa é a desconstrução da ideia de que vocês, pais, são coadjuvantes, que estão nos fazendo um favor por fazer sua obrigação. Imagine se a gente fosse exigir um reconhecimento a cada troca de fralda, mamada? Mais fácil tombar a gente.
Mas já que estamos falando sobre o que não falar, para finalizar, quero relatar alguns depoimentos que recebi no stories e também frases ditas a amigas na minha apuração: pai que diz que está cansado para a mãe que está zureta de sono (aqui isso já aconteceu também!), perguntar se a mãe não vai trocar de roupa ou se arrumar entre mamadas, cobrar mais energia ou atenção da mãe no puerpério, por exemplo. Eu sei que não tem manual para sermos pais, nem para nós, nem para vocês: mas com certeza tem coisa que você pode se perguntar antes se "é de bom tom".
Andréia Sadi é jornalista, comentarista política na GloboNews, TV Globo e CBN, apresentadora do programa "Em Foco", na GloboNews, e escreve sobre os bastidores da política no G1. Mãe dos gêmeos João e Pedro, 3 meses (Foto: João Cotta/Editora Globo)
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