Em São Paulo, e na maioria dos estados brasileiros, as aulas estão suspensas há mais de uma semana na tentativa de conter a pandemia do novo coronavírus. Desde então, o desafio de grande parte dos pais tem sido continuar trabalhando (em home office, claro) com as crianças em casa. Enquanto isso, em grupos de mães nas redes sociais, um assunto gera polêmica: "Como vão funcionar as mensalidades das escolas sem aulas?", perguntou uma mãe. "A escola do meu filho está dando aulas à distância. Nem passou pela minha cabeça questionar o pagamento", respondeu uma, prontamente.
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No entanto, muitas outras admitiram que vão questionar as instituições. "Eu acho que podemos chegar a um acordo com a escola. Para quem recebe o valor integral do salário, seria super justo continuar honrando com suas despesas, mas, para quem não consegue, um acordo é justo também", argumentou uma mãe. "Estou recebendo todas as lições da minha filha pelo aplicativo. Ela estuda período integral e tem muita dificuldade. Eu não tenho didática para ensinar. Com certeza vou questionar com o colégio, pois estamos todos no mesmo barco", contou mais uma. "Na educação infantil, o problema é ainda maior. Já que educação à distância se torna menos viável com os pequenos", completou outra.
"Fui surpreendida pela escola", conta mãe
A advogada paulista Renata Braghini é mãe de Felipe, 7 anos, e de Marina, 5, ou seja, são duas mensalidades por mês, mas, desde o dia 18, os dois estão em casa. Mas ela conta que ficou surpresa com uma decisão da escola, antes mesmo de tentar negociar os valores. "Minha intenção era questionar o colégio ao menos quanto às mensalidades do período integral, pois entram custos que a escola não está tendo, como lanches e refeições. Contudo, o colégio informou que, em abril, não haverá a cobrança da parcela relativa ao período integral e nem dos custos extracurriculares, ou seja, mais até do que, nós, mães, esperávamos", afirma.
Enquanto as aulas não retornam, a escola criou um site disponibilizando diversas atividades pedagógicas para os alunos. "Isso é bom, pois mantêm as crianças conectadas às atividades escolares. Por outro lado, ficamos quase loucas tentando administrar o trabalho em home office com as atividades das crianças", finalizou.
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Salas virtuais para os alunos
Uma saída para minimizar os efeitos da pandemia tem sido as aulas à distância. O Colégio Brasil Canadá, em São Paulo, criou salas de aula virtuais para os alunos. Com isso, a entrega de tarefas continua sendo diária e a carga horária equivalente ao período de aula. "As aulas são no formato live e gravadas, com revisões de matérias passadas e dando sequência ao conteúdo que estava previsto no planejamento letivo de 2020. O professor também está disponível para tirar dúvidas. Além disso, cada família recebeu orientações sobre como proceder durante este período em casa. Sugerimos que os pais criem uma rotina parecida com a que envolvia a ida à escola, com horários para despertar, fazer as refeições, atividades escolares e dormir. Saber o que vai fazer ao longo do dia ajuda a criança a lidar com a ansiedade de ficar em casa”, explica Bruna Elias, coordenadora pedagógica. "Todos temos que aprender as nos adaptar diantes das dificuldades impostas", finalizou. Em relação as mensalidades, o colégio preferiu não comentar.
A Associação Brasileira de Escolas Particulares (Abepar), informou que não há orientação específica em relação a cobrança de mensalidade para as escolas. "No entanto, nossa recomendação são as mesmas adotadas sempre: diálogo com as famílias, especialmente neste momento complexo. No caso das refeições, tem que ser resolvido caso a caso, não há outra forma", afirmou o diretor da Abepar, Arthur Fonseca Filho.
Pagar ou não pagar? Tire suas dúvidas
Afinal, o que é e o que não é permitido nesse momento de incertezas? O professor especialista em direito econômico, Washington Perozin, e Fernando Capez, diretor executivo do Procon-SP.
C: Os pais podem optar pela suspensão do pagamento nas escolas que não disponibilizam aulas à distância ou qualquer outro serviço aos alunos?
W: É importante deixar claro que o Ministério da Educação (MEC) autorizou que as aulas fossem ministradas remotamente, não que fossem suspensas. Orientou que as escolas buscassem atividades alternativas. Na hipótese de não oferecerem nenhuma alternativa, os pais podem, sim, romper o contrato, mas, para isso, é preciso buscar uma autorização judicial. Ou seja, entrar com uma medida preventiva para que o poder judiciário autorize a suspensão do pagamento referente ao período em que não houver prestação de serviço, sem a cobrança de qualquer tipo de multa por quebra de contrato. Mesmo as creches, que atendem aos menores, podem orientar os pais com atividades pedagógicas, de rotina e atividades. Se não houver nenhum tipo de prestação de serviço ou orientações, os pais podem rever o contrato, mas também por meio judicial.
F: Estamos vivendo uma crise extraordinária, diferente de tudo o que já passamos. O Procon está acostumado a lidar com cancelamentos eventuais, mas nunca enfretamos uma situação como essa. Nem mesmo o Código de Defesa do Consumidor foi escrito prevendo essas situações. Portanto, por enquanto, a orientação da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), é para que não haja interrupção do pagamento das mensalidades. As escolas que puderem devem oferecer aulas à distância; nas situações em que não for possível, o melhor é esperar pela reposição das aulas. O mesmo vale para o transporte escolar. A pretação de serviço que não pode ser feita presencialmente, deve ser adiada. Já os pais que tiverem dificuldades financeiras por conta de desemprego ou crise, devem procurar as escolas para negociar e o Procon, que poderá ajudar nessa mediação.
C: Os pais podem negociar o valor das mensalidades, principalmente no que se refere as refeições? Se sim, como isso deve ser feito?
W: Sempre! Nesse momento, como se trata de uma crise social e que envolve uma série de fatores - principalmente, o psicológico da população -, a negociação é o mais recomendado. Todos terão que sentar e conversar. Se o almoço não está sendo oferecido e a escola não está gastando com insumos, há, sim, a possibilidade de reduzirem os valores. Esses são serviços são o que chamamos de "acessórios", complementos que podem ser negociados.
F: É sempre recomedável que se procure a negociação direta. Mas, sim, é possível negociar. As escolas podem deixar de cobrar por adicionais que não estejam sendo oferecidos ou, então, quando as aulas forem repostas, esses itens não devem ser cobrados por um período. Nesse momento, a orientação é bom senso, equilíbrio e boa fé para que ninguém seja prejudicado ou leve vantagem.
C: Caso os pais fiquem inadimplentes por conta de desse período de pandemia. O que fazer?
W: No caso dos pais que não tenham condições de pagar e fiquem indimplementes, a escola tem o direito de negar a rematrícula do aluno. Portanto, primeiro, tente negociar com a escola. Se não der certo, os pais podem buscar auxílio do judiciário.
C: Algumas escolas estão antecipando as férias. Isso é possível?
W: As escolas podem colocar os alunos em férias, sim, mas esse período não pode durar mais do que o normal. O tempo em que as aulas ficarem suspensas, obrigatoriamente precisa ser recuperado. Se não houver antecipação das férias, tecnicamente, não deve haver férias depois ou a cobrança dos chamados "clube de férias".
F: Sim, recomendamos tudo o que é possível pra manter a normalidade. Mas gostaríamos de frisar que, agora, não é possível dar orientações válidas para muitos meses. Daqui três meses, por exemplo, se a pandemia persistir, teremos que reavaliar a situação e, talvez, as orientações sejam outras. Nesse momento, não podemos focar em situações individuais, caso contrário, a coletividade perderá.
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