Friday, April 3, 2020

Minha vida com meus filhos no grupo de risco em tempos de coronavírus

Maitê Maria e Lucca, filhos de Teresa Ruas (Foto: Arquivo Pessoal)

 

Gestantes, mães e pais de recém-nascidos, bebês, crianças em seus primeiros anos de vida ou que ainda necessitam de uma atenção maior em seu cotidiano, não se culpem ou se exijam ao máximo... Estamos vivendo uma fase de adaptação e enfrentamento de uma realidade desconhecida por todos nós.

Se você está, nesse momento, em uma UTI Neonatal ou é uma gestante, o que de mais precioso você pode fazer é o isolamento social. Pense que você teria essa mesma orientação de qualquer maneira, sem Covid-19 ou com, até porque estamos entrando em um período de maior circulação de outros vírus respiratórios, tais como: o VSR- vírus sincicial respiratório, causador da grande maioria das bronquiolites e pneumonias em crianças de até 2 anos de idade- H1N1, entre outros vírus respiratórios, tão sabidos e conhecidos por pais de UTI, não é mesmo?

Mas eu ia fazer meu chá de bebê, ia receber as pessoas mais próximas em casa depois e sair da maternidade... Sim, eu sei o quanto é frustrante, triste e marcante não ter eventos tão característicos de uma gestante e de uma puérpera. Já passei por isso duas vezes com os meus dois filhos prematuros. Mas, por outro lado, aprendemos que podemos festejar a vida e a alegria em outros momentos com os nossos amigos e familiares. Eu mesma, por exemplo, tive que esperar o terceiro ano de minha filha para que eu pudesse apresentá-la a todos os meus amigos. E enquanto eu tinha que me isolar socialmente com ela e meu marido, tentávamos agradecer, diariamente, a vida de nossa pequena, o seu sorriso, todas as suas conquistas e o fato de ela estar em casa. Nem todos os dias, acordava com esse alto astral, mas sempre tentava ver o quanto podia ter gratidão à vida, pelo fato de termos vencido tantos desafios e estarmos ainda em família.

Se estava tudo planejado com a sua mãe, sogra, amiga, enfermeira ou babá para te auxiliarem após a alta da maternidade, da UTI Neonatal ou Pediátrica, é tempo para respirar, se acalmar e perceber o quanto o ambiente da casa foi tão esperado por você. Demonstrar para o nosso filho que ele tem um lar, um quartinho, um bercinho e alguns mimos que foram adquiridos porque ele ia chegar ao mundo, pode ocupar o coração dos pais com tamanha alegria, que as dificuldades de adaptação, sem a ajuda necessária, com um bebezinho em casa podem ter um outro peso.

Sim! Eu sei o quanto é exaustivo e cansativo. Por isso, tudo bem se o lixo ficar cheio de fraldinhas sujas; os paninhos de boca se acumularem para lavar; você passar o dia inteiro de pijama e não escovar os dentes; comer um sanduiche, em vez de uma comida mais saudável; chorar muito e por qualquer coisa. Você está no puerpério, um momento difícil e único para qualquer mulher. Não se sinta louca por querer chorar e se sentir tão exausta. Isso vai acontecer. Todas nós choramos muito nesse período e mal conseguimos pentear os cabelos. Essa é a grande verdade. Porém, você está em seu lar. Inclusive, algumas de vocês conseguiram sair do hospital e alcançar a tão sonhada alta hospitalar. Se eu pudesse te dar um conselho de obrigatoriedade nesse momento de isolamento social, te diria que a única coisa que você precisa se cobrar e não pode se esquecer é: tomar muita água, pois ela é essencial para a produção do leite materno.

Está com muita dificuldade em amamentar? Estamos em um momento em que pessoas competentes, sérias e com muita experiência nessa área estão dando dicas preciosas e atendimentos online, pelo whatsap, pelo telefone... se você acha que esse tipo de atendimento pode te acalmar, procure por ele. Isso não significa que está sendo uma mãe insegura e cheia de neuroses. Apenas que é uma recém-mãe e que necessita ser acolhida, ouvida, compreendida em um momento em que pessoas muito queridas, nas quais você confia, como a sua mãe, devem ficar em casa. Se não se sente segura com esse tipo de atendimento, dê tempo ao tempo. Lembre-se de que você nunca foi mãe desse bebê. Você e ele precisam aprender muitas coisas juntos, inclusive o amamentar e ser amamentado.

Maitê Maria, filha de Teresa Ruas (Foto: Arquivo Pessoal)

 

Se você já passou da fase de UTI, maternidade, recém- nascido, mas tem ainda um bebezinho em casa, tente ganhar tempo para a rotina do dia a dia não ser ainda mais pesada. Uma das dicas é tentar escolher um dia na semana e tentar fazer as papinhas, congelar alguma comida ou ir ao supermercado. A casa ficará suja? Sim! As roupas para lavar formarão uma montanha gigante? Sim! Você abrirá um pacote de biscoito, em vez de uma salada? Sim! Você atacará uma lata de leite condensado com Ovomaltine, em vez de pensar que o açúcar não faz bem e que você precisa voltar ao seu peso? Sim! E tudo bem! Não somos pessoas desnaturadas ao fazer tudo isso... Estamos cheias de afazeres domésticos e mais ansiosas por tantas mudanças em nossas rotinas, planos e cotidiano. Vamos maneirar um pouquinho mais com a gente, ok?

Você não tem mais que se preocupar com papinhas, fraldas, mamadeiras e afins de um bebezinho, mas tem crianças pequenas ou que ainda não apresentam tanta autonomia nas atividades diárias? Comece o dia respirando devagar, acalmando o seu coração e vivendo um dia de cada vez. Estou nessa fase atual, com Maitê Maria de 7 anos e Lucca de 3 anos, ambos pertencentes ao grupo de risco por terem problemas respiratórios, vindos da prematuridade. É exaustiva essa nova realidade? Sim! Tão exaustiva que, na semana passada, fui dormir sem jantar. Preferi dormir do que comer! Cozinhar, lavar roupa, limpar a casa, manter duas crianças em um apartamento, fazer as aulas da escola online, trabalhar, tentar respirar e acalmar o coração. Assim, às vezes, tudo atropelado, com os dois filhos exaustos por estarem presos em um espaço pequeno, tem sido um desafio diário para mim e para todas nós, não é mesmo?

Lucca, filho de Teresa Ruas (Foto: Arquivo Pessoal)

 

A casa suja já faz parte da minha rotina e tudo bem. Não conseguimos fazer todas as atividades online da escola de português, matemática, inglês, artes e etc... paciência! Ainda não tenho e não temos o “diploma de pedagoga¨. As crianças ficaram um tempo muito maior na televisão ou em outros recursos tecnológicos, do que o que estavam acostumadas? OK! A pandemia vai passar e todos vão querer passear ao ar livre, andar de bicicleta, ir ao clube, encontrar os amigos, ir ao cinema... Tenho pensado que será uma ótima oportunidade para a nova geração verificar o quanto a tecnologia é importante em nossas vidas, mas o quanto o encontro presencial, o abraço, o brincar junto é existencial. Talvez sejam muito, mas muito melhores do que nós, em compreender o equilíbrio entre as experiências presenciais e as tecnológicas.

Ouvi da minha grande amiga e parceira de trabalho no @prematurosbr e @to_integrasense, Ana Luiza Andreotti , que estamos em um momento de incubadora. E como sabem tudo o que vem de um ambiente de UTI me afeta de uma outra forma, não é mesmo? Incubadora? Sim! Estamos isolados do mundo, assim como ficamos em uma UTI, e sempre pensando e refletindo nos rumos de uma nova experiência de sermos pais de UTI, com uma rotina hospitalar bem diferente do que sonhávamos, vivenciando sentimentos difíceis e nunca imaginados; mas que nos potencializam a dar valor a outros aspectos da vida.

Ah, nós pais de UTI, como mudamos depois de vencer tantos desafios... Um abraço de um amigo ganha um outro sentido; tomar um café da manhã com a família ganha um outro valor; caminhar pela praia se torna uma atividade muito valiosa. Estamos em uma incubadora chamada ¨lar¨ e com a presença de pessoas que amamos muito. Em vez de fios, barulhos e procedimentos característicos de uma UTI, temos mais carinho, beijinhos, mãos dadas, rostos coladinhos no sofá. Podemos almoçar e jantar juntos todos os dias, independente da idade, características ou necessidades dos filhos. Podemos ler livros de histórias todas as noites, porque não estamos chegando muito tarde em casa; podemos dançar e cantar com os nossos filhos, músicas que marcaram a nossa adolescência; podemos comer muita pipoca, depois de vários filmes; podemos passar o dia inteiro de pijama; podemos deitar no chão e receber aquele abraço de nossos filhos; podemos não realizar a terapia dos nossos filhos e, em vez disso, aproveitar para brincar livremente com ele. Estamos incubando em nós e neles que muito mais importante do que ter uma casa limpa; rotinas diárias inflexíveis; comidas saudáveis e frescas todos os dias; manter a produtividade no trabalho – algo impossível-; realizar todas as tarefas da escola. Estamos cultivando o amor, o respeito, a resiliência, o contato afetivo familiar, a empatia com o outro, a compreensão dos nossos diversos sentimentos – incluindo o tédio, a tristeza, a raiva, a frustração- e o convívio direto e constante em FAMÍLIA! Sim! Esse período de incubação nos trará uma outra forma de viver, sentir e ser! Portanto, vamos continuar em nossas incubadoras e ser mais amorosas com nossa exaustão e nosso cansaço diário, ok?

Um grande abraço, com afeto, Teresa Ruas e toda a equipe que está comigo auxiliando e ajudando muitos pais e famílias nesse momento.

Teresa Ruas, a filha Maitê, o marido Marcel e o filho Lucca (Foto: Arquivo pessoal)

 

Teresa Ruas é terapeuta ocupacional infantil, organizadora do livro Prematuridade extrema: olhares e experiências e mãe de Maitê Maria e Lucca, que nasceram prematuros. É também autora do site Prematuros. Siga-a no Instagram @prematurosbr.

 



from Crescer https://revistacrescer.globo.com/Colunistas/Teresa-Ruas-Vida-de-Prematuro/noticia/2020/04/minha-vida-com-meus-filhos-no-grupo-de-risco-em-tempos-de-coronavirus.html

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