"Não sai nada do meu peito!" Diz ela, frustrada, a respeito do seu seio materno.
Nos meus 8 anos, trocando mensagens com mães em pleno processo de entrada na maternidade, ouvi um sem número de vezes essa frase: "não sai nada".
Por aqui, ando parada, a pensar sobre do que se trata este nada. De que vazio e ausência pode estar falando? A amamentação tem dessas coisas, traz, como faz um mensageiro, notícias do encontro com o bebê, que é atravessado por tantos desencontros.
E esse tal leite, que deveria jorrar, mas não jorra, dialoga diretamente com a expectativa de uma maternidade que, diz o discurso social, deveria surgir imediatamente, num passe de mágica: a mãe que nasce pronta para um bebê que também não falha. Tudo isso nos fala do quanto não somos/estamos preparadas para o real do maternar, o quanto somos induzidas (e nos deixamos induzir) pela promessa de uma experiência plena, na qual não há faltas nem imperfeições.
Difícil tarefa a de comunicar, neste contexto tão ilusório e enganoso. Mas não é hora de desviar o olhar, muitas são as mães que fazem sua trajetória de forma solitária e sofrida.
As evidências são muitas, de que é preciso parar para escutar, legitimar e dar nome à dor dessas mulheres. Entre as palavras tecladas nas trocas de mensagens, um puro ato falho emerge. E assim, o corretor automático do teclado faz a dúvida virar dívida. Leio, sem surpresa:
“- Oi Chris, eu tenho uma dívida", eu não sei porque, mas o meu bebê não está ganhando peso, você pode me ajudar?” Nasce um bebê, com ele nasce uma mãe e uma dívida.
Mas devemos o quê a quem, pergunto eu, que há tanto venho tentando entender do que se trata essa coisa que é ser mãe na nossa era. Enquanto aguardamos ansiosas que nas primeiras horas, dias e semanas, depois da chegada do bebê, jorre o leite materno ou uma certeza e um saber, o que na verdade fazemos, de forma desavisada, é ingenuamente acreditar no que nos falam se tratar a tal maternidade.
A maternidade é inata, fomos biologicamente construídas para gerar e cuidar dos nossos filhos, dizem... A Natureza nos fez cuidadoras natas. #SÓQUENÃO. Muitas de nós (me arrisco dizer que a maioria) não têm a menor ideia do que se trata ser mãe e faz o seu caminho a cada dia, tijolo por tijolo. Trabalho árduo este, mas essencialmente criativo, revelador e revolucionário, pois tem o potencial de transformar tudo e todos à volta. As famílias que não sucumbem à pressão da demanda social sedimentam um caminho promissor.
Estou eu aqui, e talvez algumas das mulheres que me leem neste texto, pensando que é daí que vem essa sensação de que, à alternativa da potência máxima materna, só nos resta a metáfora do seio materno do qual não sai nada. Ficamos sem um meio termo, que (este sim) poderia muito bem dar conta do recado. Com tamanhas expectativas, tanto a nossa como a de todos à volta, não temos como não nos sentirmos incapazes de atender esta desmedida demanda social, que introjetamos e perpetuamos.
Nosso desafio maior nos dias de hoje é a desconstrução nessas crenças, que nos fazem acreditar na categoria de um saber maior que sirva para todos, no qual as respostas são sempre as mesmas. A mim fica cada vez mais claro que na maternidade não existe um “para todos”, mas sim a consideração de um singular. De fato, inadvertidamente esperamos por este trem da maternidade ideal que nunca chega. E ali ficamos, na plataforma da estação, paralisadas e sem rumo. Não é à toa que desmamamos, pois o que temos para oferecer nunca é suficiente.
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