“Pai, desculpa por não ter feito a aula de ginástica (barulho de choro)! Desculpa não ter deixado você feliz. Você foi embora triste (mais choro)”.
Esse foi o áudio de WhatsApp mais doloroso que já ouvi na vida. Antes que caísse no choro também, peguei o telefone e liguei pra casa pra falar com Julia... E a conversa de uns dez minutos no telefone foi sofrida. Ela chorando de um lado e eu do outro tentando acalmá-la, explicando que estou do seu lado sempre. Mas deixa eu contar o porquê desse pedido de desculpas, da mensagem, do telefonema.
Naquele dia, levei Juju no Flamengo para começar numa turma de ginástica. Era uma quinta-feira. Já tínhamos ido na terça e ela preferiu só assistir. Disse que gostou e que faria uma aula experimental dois dias depois. Chegamos atrasados, ela botou a roupinha de ginástica e já saiu do banheiro na minha direção dizendo que não queria fazer a aula. Era realmente um ambiente que pode se tornar intimidador para qualquer criança. Ginásio grande, várias turmas, muita gente, ninguém conhecido, as meninas da sua idade já treinando naquele momento... Tentei convencê-la, disse que tinha certeza que depois que ela fizesse a primeira aula iria gostar.
Disse que eu também já me vi naquela situação várias vezes: num lugar novo, com pessoas que nunca tinha visto e que não era fácil para mim também. Não adiantou! E como eu não quis fazer daquilo um grande problema, depois de uns 5 minutos de negativas, falei “então tá, tranquilo. Não quer, tudo bem. Tentamos outra vez”. Mas senti que ela estava chateada. Fechou a cara, não quis me dar a mão, não queria falar direito... E logo depois ela foi embora de táxi com Rita (que trabalha lá em casa) e eu fui trabalhar.
No caminho, eu estava meio chateado, achando que Julia tinha ficado triste comigo por tê-la levado lá e por ter tentado convencê-la. E também porque não queria que aquilo fosse um problema pra ela. Enfrentar o novo, o desconhecido nunca foi muito fácil pra mim, não queria que Julia passasse por isso também. Embora saiba que essas situações vão se repetir e vão ajudá-la a se fortalecer. Mas o principal motivo para Juju ter fechado a cara para mim, não ter me dado a mão, não ter falado direito comigo naqueles minutos entre o momento em que a gente foi embora da ginástica e a hora que ela entrou no táxi com Rita foi outro. Ela estava chateada por achar que eu estava triste E por achar que me decepcionou. Por isso, o tal áudio e a tal ligação que citei lá no começo do texto. Na sua cabeça, ela tinha me decepcionado!
Foi difícil fazer Juju entender que eu não estava triste com nada, e que, logicamente, não tinha nenhuma decepção nessa história. Disse a ela que estou sempre do seu lado, e que a apoio se ela quiser ou não fazer a tal ginástica. E ela do outro lado da linha repetiu soluçando e chorando: “eu sei que você está triste. Desculpa.” No fim, acho que ela acreditou em mim. Um pouco mais tarde, liguei de novo, brincamos, e ela foi dormir mais tranquila. Depois disso, eu, que estava prestes a entrar ao vivo numa transmissão de um jogo de futebol, consegui trabalhar um pouco mais tranquilo. Fato é que Julia tem um coração do tamanho do mundo. Pensa sempre nos outros, muitas vezes antes de pensar nela. Foi assim comigo dessa vez, é assim com sua mãe, amigos, vovós, primos em tantas outras situações. Essa é uma característica da sua personalidade muito clara! Mais um dos milhares de motivos pra fazer dela essa pessoa apaixonante!
Bruno Côrtes é pai de Julia, 6 anos. Já viveu um ano e meio longe da filha por causa do trabalho. Foi correspondente do SporTV em Nova York. Hoje, aproveita cada minuto ao lado dela. E tenta adequar a vida corrida de jornalista com a de pai.
from Crescer https://revistacrescer.globo.com/Colunistas/Bruno-Cortes/noticia/2018/08/o-choro-que-faz-qualquer-pai-feliz.html