As pessoas sempre acham que por ter sete filhos, passar mais da metade da minha vida sendo mãe (são 24 anos nessa função), e estudar os assuntos ligados à parentalidade minha casa é um lar de paz e harmonia o tempo todo. Recebo perguntas sobre como faço para tudo funcionar, comentários que meus filhos são obedientes e que eu sei sempre o que fazer.
Mas eu sempre contesto essa ideia. Acho que tenho até uma certa obrigação de dizer que não, não é bem assim. Em muitas ocasiões as coisas dão errado, fico sem ação, minha casa se torna um caos.
Quero, aliás, dividir aqui uma história bem particular com vocês, sobre algo recente e que mexeu muito comigo: minha filha mais nova, a Bia, tem 3 anos e está numa fase bem complexa. Quem entende um pouquinho já imagina que estamos falando do famoso “terrible two” ou “a adolescência da infância.”
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Ela passou a se entender como indivíduo separado de mim, que tem vontades e atitudes a colocar pra fora. Passou a fazer parte do vocabulário o “NÃO”: “não quero tomate”, “não quero essa roupa”, “não quero agora”, “não sou mais pequena, sou”. Aquele bebê fofinho agora sabe que tem voz e começou a exercê-la. Só que o cérebro dela não está pronto para lidar com o turbilhão de emoções. Resultado gritos, raiva... a “birra” em sua melhor forma. Se estressa fácil, joga o que estiver na mão longe.
Enquanto isso eu sigo tentando ser compreensiva e sei que não é um momento fácil. Se para nós a tomada de decisões não é fácil, imagina pra eles! Eu a acolho, abraço, converso. Ela até se acalma rapidamente, mas com a mesma velocidade tudo fica fora de controle novamente. É muito cansativo.
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Mas, claro, não fui pega de surpresa. É a sétima vez que passo por isso. Só que essa semana aconteceu algo que me doeu muito. Estávamos todos no carro, voltando da escola, e ela me pediu um biscoito que estava num saco para mostrar para as irmãs. Eu peguei, mas ela disse que queria dentro do saco. Eu expliquei que o saco tinha outras coisas, de vidro inclusive, e que não poderia entregar à ela. E tornei a entregar o biscoito. Ela não só jogou o biscoito longe como começou a gritar e a arranhar o próprio rosto. Arranhava e gritava e arranhava mais ainda. Era desesperador estar no carro, e tentar, em vão, impedir aquela agressão contra ela mesma.
Quando tudo se acalmou eu tinha uma menininha com muitas lágrimas nos olhos, rosto todo arranhado e sangue nas bochechas e na testa. Eu tinha irmãos em choque sem saber o que pensar, o que falar, como agir. E tinha uma mãe desesperada, chorando e sangrando por dentro tentando entender como aquilo aconteceu. Ela, também em choque, olhou para mim e disse “e agora mamãe? E agora?” com lágrimas rolando, também sem entender o que tinha sido aquilo. Eu mal respirava.
Eu quis entender. Eu quis chorar. Eu quis sumir. Eu queria voltar no tempo. O que eu fiz foi acolher, cuidar, dizer que estava tudo bem, que tinha passado. E quando chegamos em casa conversamos um pouco enquanto eu passava pomada em uma menina assustada.
Uma hora depois ela estava bem, mas eu não. Eu estava com a cabeça a mil tentando ler a necessidade por trás daquele comportamento, tentando saber onde tinha errado. Me machuquei mais ainda listando as minhas ausências e possíveis erros dos últimos dias. Sofri, tive vergonha, tive tudo. Eu, a mãe de sétima viagem. Até que parei, me acolhi e pensei com calma.
Não era justo comigo sabe? Hoje eu entendo: ela estava com sono, sentiu como se eu não a estivesse compreendendo e depois não estava atendendo, ficou frustrada e explodiu. É muita coisa acontecendo dentro dela.
Pronto, está tudo bem. De lá para cá ela está bem mais calma, e estamos nos comunicando melhor. O que eu quero contando tudo isso é mostrar que ninguém está livre de passar por uma experiência dessa. Mesmo com conhecimento, experiência e calma nada disso é garantia de que passaria imune.
Vamos errar, vamos continuar muitas vezes sem saber como agir e as coisas sairão do controle. Bem-vinda a maternidade real! Muna-se das ferramentas que puder, mas saiba que é dessa forma que nossos filhos vão aprendendo como é a vida de verdade. Perdoe-se, aceite-se e se acolha. Eu sei que em muitos momentos vai doer. Mas vai ter valido a pena, ao menos, pelo aprendizado.
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