Sunday, May 9, 2021

MÊS DAS MÃES | Mães no front | "Trabalhar em hospital público era para os fortes, agora é para os sobreviventes", diz enfermeira e mãe de quatro filhos em SP

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Oito em cada dez profissionais da saúde que atuam na linha de frente do combate à covid-19 no Brasil são mulheres: agentes comunitárias, profissionais de enfermagem, médicas, fisioterapeutas, psicólogas, técnicas... Para elas, seja por vocação, seja por necessidade, ficar em casa não é uma opção. Nem por isso ficam confortáveis ao serem chamadas de super-heroínas. 

 

Uma pesquisa da Fiocruz sobre as condições de trabalho mostrou que metade dos profissionais no front está com jornadas acima de 40 horas semanais – sendo que 14% declaram ter chegado ao limite da exaustão. Entre as alterações mais comuns em seus cotidianos: 15% apresentam perturbação do sono, 13% irritabilidade/choro frequente, 11% incapacidade de relaxar.

“Quem está na ponta do atendimento, diante de pacientes em estado crítico, tem uma demanda emocional muito grande”, afirma a médica Sley Tanigawa Guimarães, integrante da OUVID, iniciativa do Hospital Israelita Albert Einstein (SP) para dar suporte emocional aos funcionários por meio de uma linha direta, psicoterapia e ações como rodas de conversa nos setores de covid.

“Esperávamos que tudo isso fosse durar alguns meses e, então, completamos um ano com um tsunami de casos. Estamos trabalhando a resiliência desses profissionais: é importante que consigam encontrar, mesmo em meio ao caos, um ambiente interno de mais tranquilidade”, diz Sley. Falar sobre os sentimentos e as experiências enfrentadas ao longo da crise sanitária, segundo a médica, é uma das ferramentas para acalmar. Adotar hábitos saudáveis, como se alimentar bem e praticar exercícios, também. E, a julgar pelos quatro depoimentos de mães profissionais da saúde que você verá nesta série.. desfrutar da companhia dos filhos alivia a dura rotina.

 

 

 

"MEUS FILHOS ME DÃO FORÇAS"
* (Foto: Acervo pessoal)

 

"Faz mais de um ano que abro os olhos ao acordar e rezo.Peço a Deus pela minha vida, da minha família e dos inúmeros pacientes que assisto como enfermeira no Hospital Heliópolis, em São Paulo (SP). Se, antes da pandemia, trabalhar em hospital público era para os fortes, agora é para os sobreviventes. Tive muitas amigas que pediram exoneração do cargo, e outras que não resistiram ao coronavírus. Como enfermeira responsável pela recuperação da anestesia do centro cirúrgico, eu sou a primeira a dizer um ‘bem-vindo de volta à vida’ aos pacientes. O problema é que, de um ano para cá, tudo mudou, e são poucos os ‘renascimentos’. Pior ainda é ter de decidir, junto com a equipe, quem vai primeiro para o tubo, quando temos superlotação. No começo da pandemia, precisei cuidar de um morador de rua com suspeita de covid-19 e fiquei muito abalada. Chegar em casa e ver meus filhos sempre me deu força para continuar. Muitas vezes, é com o mais velho, o Guilherme, que tem 20 anos, que eu desabafo. Até parei de fazer isso, porque percebi que os mais novos acabavam ouvindo e ficavam assustados. O meu caçula sofre de bronquite asmática e sempre tive pânico de passar o vírus para ele. No ano passado, ele precisou ser internado durante uma semana até que o exame de covid desse negativo. Ele se recuperou bem da crise de bronquite, mas, após esse susto, decidi deixá-lo com os meus pais. Pouco tempo depois, como sentia muita falta dos irmãos, trouxe-o de volta para casa. Geralmente, durante a semana, sou eu e eles, porque o meu marido viaja bastante. Brinco que o Guilherme é minha rede de apoio, pois é ele que me ajuda com tudo até meu companheiro assumir, no final de semana. Estou completamente esgotada, porque tenho de fazer várias horas extras no trabalho pela necessidade do hospital, e também por conta dos gastos. Como eles estudam em escola pública, precisei comprar três celulares para que pudessem acompanhar as aulas online. Agora, tenho de lidar com um princípio de fobia deles. Por ficarem tanto tempo dentro de casa, não querem mais sair para nada, nem para dar uma volta no quarteirão. Por toda essa exaustão física e mental, procurei um grupo de apoio psicológico na internet que está me ajudando com todos os medos e angústias e que me faz acreditar que tudo isso vai passar.”
Fernanda Cardoso, 41 anos, é mãe de Guilherme, 20, Lucas, 10, Miguel, 9, e Marcos, 6

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