A paternidade chegou na vida do empreendedor social Leandro Ziotto, 34, de uma forma sutil e, ao mesmo tempo, arrebatadora. Há 8 anos ele conheceu Mariana, que já era mãe de Vinícius, na época com 3 anos. O relacionamento se estreitou e, com o passar do tempo, ela decidiu que era hora de apresentar o namorado ao filho. “Logicamente, na época ele respondeu com ciúmes, mas logo de início tivemos uma sintonia muito boa. Também tomei o cuidado de dar a ele a segurança de que não roubaria a mãe dele, e muito menos, substituiria a figura do pai dele, que sempre foi presente. Eu era mais uma pessoa que chegava para somar cuidados, afeto e amor”, conta Leandro, que se auto-intitula pai “socioafetivo” de Vinícius. A sintonia aconteceu na mesma hora, já o amor foi um sentimento construído ao longo das semanas, com o apoio não só da mãe do menino, como também de outros familiares. “Vini também foi muito sensível em perceber o sentimento que nos rodeava. E se permitiu viver aquela nova situação”, diz.
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A “ficha” que a relação havia evoluído para a de pai e filho caiu na beira de uma piscina, quando Leandro foi “adotado afetivamente” por Vinícius: “Estávamos viajando juntos para o litoral de São Paulo. Eu estava no bar da piscina, de costas para o Vini e a Mariana, quando, de repente, comecei a escutar uma criança gritar incessantemente: “Paaai”, “paaai”. E, claro, nem dei atenção. Mas a criança não parava. Me virei procurando pelo pai daquela criança e vi o Vinícius acenando para mim de dentro da piscina. Caiu ali a minha ficha de que o adulto irresponsável que não respondia àqueles gritos era eu! Ali, me senti pai pela primeira vez”, relembra Leandro. A atitude pegou o empreendedor de surpresa, afinal, até então ele tinha se colocado apenas na função de um adulto cujas responsabilidades eram dar exemplo, cuidar, brincar... “Foi um 'baque' entender que aquilo que, até então, era responsabilidade, havia evoluído para o amor. Um amor que cresceu e se fortaleceu, a ponto de não ser sentido apenas com o coração, mas com a pele, o estômago, a alma”, reflete.
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Juntos, apesar da separação
Quando Vinícius completou 4 anos e meio, o casal resolveu que era hora de morarem juntos. Desde então, Leandro cuida diariamente de Vinicus. “Almoço, janta, banho, escola. Faço questão de estar muito presente na rotina dele. Reforço que ele tem um pai biológico muito presente, que participa da vida dele”, diz Leandro, que atualmente está separado da mãe de Vinícius, e fica com o menino às segundas e quartas-feiras, além de alguns finais de semana, e segue com o contato diário: “almoçamos juntos, fazemos lição de casa, conversamos muito sobre vários assuntos. Isso é uma rotina”, diz. Leandro afirma que o fato de estar separado da mãe do garoto não interferiu na relação que ele tem com Vinícius. “O mais importante é que o respeito e a admiração continuam, especialmente o respeito da mãe dele pelo amor que tenho pelo Vini e vice-versa". Leandro tem uma nova companheira, que passou a compartilhar também do respeito e da admiração pelo menino, hoje com 11 anos.
Ao contar sua história, Leandro ainda encontra olhares desconfiados, que parecem indagar: “Como assim pai socioafetivo?”. Ele responde: “Temos essa estrutura e dinâmica que muita gente não entende, acha confusa e até tóxica ao Vini. Mas não os julgo, pois, infelizmente, é um preconceito que existe quando não se vivencia algo parecido. O fato é que o Vini é uma criança privilegiada por ter tantas pessoas ao seu redor, que o amam e que compartilham, cada um do seu jeito, o cuidado e o afeto com ele.”
A responsabilidade de criar um menino
Quando questionado sobre a parte mais desafiadora da paternidade, Leandro reforça que a principal responsabilidade é justamente por criar um menino tendo a consciência da importância e da responsabilidade dessa função. “Luto para não perpetuar o mesmo machismo e masculinidade tóxica tão estrutural em nossa sociedade. Infelizmente, num mundo desigual que vivemos, gosto de mostrar para o Vini que o fato de ele ser homem, branco e de classe média, é sim um privilégio. Mas ele pode usar isso de uma forma boa: para que outras pessoas possam um dia gozar das mesmas vantagens, sem restrições de cor, raça ou gênero”, diz. Sobre os maiores bônus da relação, Leandro é enfático ao afirmar que Vinícius tem o abraço mais gostoso do mundo. “Ele mal sabe, mas toda vez que nos abraçamos, não sou só eu que estou o acolhendo. Ele me acolhe também.” No primeiro Dia dos Pais que tiveram após a separação, Leandro se emociona ao contar que Vinícius o surpreendeu com uma cartinha dizendo que o amava muito e que estariam sempre juntos.
Paternidade como gatilho de transformação
Vinícius despertou em Leandro não só o sentimento de pai, mas a vontade de compartilhar os aprendizados da paternidade com outros homens, de modo que eles entendessem a importância de assumir, efetivamente, seu papel de pai. “Infelizmente o machismo afasta os pais de criarem seus filhos com afeto, ao mesmo tempo que é por conta dele que as mães ficam tão sobrecarregadas mentalmente, emocionalmente e fisicamente. Me dedicando ao assunto descobri que a paternidade é um ato afetivo, social e também político. Quando falamos de paternidade, falamos também de maternidade, de equidade de gênero, direitos humanos”, acredita. Com essa mentalidade, Leandro criou em 2016 a plataforma de conteúdo e formação parental 4daddy. A missão do projeto é sensibilizar a sociedade civil, empresas e o Estado para a importância da paternidade como gatilho de transformação do homem, como função importante para o desenvolvimento saudável das crianças e adolescentes, e como antídoto ao machismo e à masculinidade tóxica. “Trabalho criando rodas de conversas, cursos, ações e programas em empresas, escolas e organizações sociais. E atuo com políticas públicas em duas redes: Rede Nossa São Paulo e Rede Nacional Primeira Infância”, conta. Como se pode ver, transformação é o que não falta na vida de Leandro desde que Vinícius chegou.
from Crescer https://revistacrescer.globo.com/Dia-dos-Pais/noticia/2019/08/dia-dos-pais-paternidade-e-gatilho-de-transformacao-do-homem-e-antidoto-ao-machismo.html