Monday, August 5, 2019

Mães de UTI: "não basta ter amor para amamentar", diz mãe de dois prematuros

A higiene da bomba extratora de leite deve ser feita com cuidado (Foto: Thinkstock)

 

As pesquisas na área da saúde materno-infantil, a Organização Mundial de Saúde (OMS) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) já verificaram que o ato de amamentar é um processo muito maior do que, simplesmente, nutrir a criança. Envolve uma profunda interação entre mãe e bebê, influenciada pelo contexto social, repercutindo no estado nutricional, de crescimento, fisiológico, imunológico e emocional da saúde do bebê e da mãe.

Isso quer dizer que o aleitamento materno não é um ato que depende somente do bom estado de saúde da mãe ou de aspectos puramente fisiológicos ou por exemplo, pelo desejo imenso de vivenciar o aleitamento materno. Ao contrário, amamentar é uma prática que recebe influência de todos os fatores fisiológicos, emocionais, psicológicos e sociais atuantes desde o período do pré- natal. O contexto familiar e social de uma mulher vivenciando o puerpério, em especial das mães de prematuros ou bebês que precisam permanecer em uma UTI por diversas razões, precisa compreender o quanto essas mães são conscientes, informadas e orientadas sobre a importância do leite materno.

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Prematuros não aprendem por antecipação como os bebês nascidos a termo (Foto: Thinkstock)

 

Costumo dizer que mãe de UTI sabe "de cor e salteado" que o melhor alimento que existe para todo bebê é o leite materno e ele significa vida, especialmente para os prematuros extremos. A própria composição do leite materno é quem oferece os benefícios nutricionais e imunológicos a todo bebê, protegendo contra tantas doenças. Além, é claro de favorecer o ganho de peso mais rápido, curvas de crescimento mais adequadas e um menor período de internação. Mas, apesar de sabermos que leite materno é VIDA, por que será que nem todas as mulheres conseguem realizar o aleitamento materno, mesmo após a alta do bebê? Será mesmo falta de persistência, paciência, aceitação, ou outros julgamentos que a sociedade dita para essas mulheres? Antes de me posicionar sobre isso, vale ressaltar que a amamentação passa por 3 fases:

1- Produção do colostro -  Aquela substância amarelada, rica em anticorpos, proteínas e que tem menos gordura do que o leite já maduro;

2- Descida do leite - Chamada de apojadura, na qual as mamas ficam mais cheias e doloridas ocorrendo em torno do terceiro ou quarto dia, após o part;

3- Dependente da sucção - É a fase que pode se manter durante todo o aleitamento materno, mas que depende diretamente da sucção do leite pelo bebê e de um adequado esvaziamento da mama. Nessa última fase, grande parte do leite de uma mamada é produzida enquanto a criança mama, recebendo influências de ordem emocional, tais como a visão do rosto do bebê, o cheiro, o choro de fome, senti-lo no colo, ter tranquilidade e autoconfiança.

E o que todas essas fases do aleitamento quer dizer para as mães de prematuros?  Que todas as mulheres em bom estado de saúde, independentemente se estarão com os seus filhos em seus braços ou não, poderão passar pela fase 1 e 2, exatamente porque o início da produção do leite é influenciado por hormônios e a "descida do leite" vai acontecer mesmo se o bebê não sugar o seio da mãe. Porém, a fase 3 está intimamente ligada à presença do bebê no seio da mãe e aos fatores emocionais e psicológicos maternos. Uma mãe mais tranquila, autoconfiante, sem medo, sem tantas angústias e sentindo o seu bebê em seu colo, produz mais ocitocina (o hormônio do amor), estimulando ainda mais a descida e saída do leite da mama. E é aí que está o xis da questão: as mães de UTI não têm seus bebês em seus braços. Muito menos estado emocional tranquilo, com menos angústias e medos. ao contrário: o medo de perder os bebês é um dos sentimentos mais presentes. 

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A informação é uma das melhores maneiras de se preparar para a amamentação (Foto: Flickr/ Dimitar Dimitrov)

 

Mesmo não tendo os nossos filhos em nossos braços e experimentando várias situações e sentimentos difíceis, passamos horas e horas tentando tirar uma gota de leite materno no Banco de Leite. Sim! A ordenha de uma mãe de UTI inicia-se com a bomba ou máquina que não emite cheiros, olhares, choros de fome, toques e vínculo afetivo para que a mulher possa se sentir mais motivada, tranquila e autoconfiante para extrair o leite e a persistir em uma árdua rotina no banco de leite, mesmo após a alta hospitalar. Além disso, a máquina é um equipamento que, frequentemente, fere os mamilos por não graduar a velocidade para a extração do leite materno, como um bebê faria normalmente. Sem contar, com toda a vestimenta que somos obrigadas a colocar para que não haja nenhum perigo de contaminação no leite. Temos que tirar a nossa roupa e no lugar colocarmos uma toca na cabeça, uma máscara em nossa face e uma vestimenta esterilizada ; além de toda a limpeza que deve ser realizada na máquina. E toda essa rotina, várias e várias vezes ao dia e durante a noite, sem o nosso bebê em nossos braços e lares.

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Em minha experiência como mãe de UTI Neonatal por duas vezes, já vivenciei a saída de sangue em vez de leite dos mamilos. Conheci a alimentação parenteral (dada por um cateter umbilical), sonda nasogástrica por meses e meses, até chegar na mamadeira como o melhor recurso para minha filha receber o meu leite. Jamais consegui amamentar minha filha prematura extrema, diretamente em meus seios. Já vi várias mulheres passarem pela mesma experiência e diante do estresse psicológico acumulativo em uma UTI, somado ao sentimento de culpa, medo e ansiedade por não estarem produzindo o alimento mais precioso para seus bebês, não conseguirem produzir leite. Assim, como já presenciei também relatos de experiência de aleitamento materno misto (fórmula e leite materno) e exclusivo, após o prematuro ou bebê de alto risco ter tido a alta. Sempre, claro, com o apoio psicológico da família, equipe de saúde e contexto social. Para as mães que enfrentam uma UTI, amamentar não é uma questão de escolha.

E se você estiver em uma UTI nesse momento, saiba que uma gota de leite, apenas 1 ml produzido em uma ordenha, requer muita comemoração, pois essa gota, além de significar VIDA e ser muito valorizada pela equipe do banco de leite, significa superação, força e garra. E para aquelas que não estão conseguindo produzir o leite materno, saiba que o AMOR por seus filhos é o grande combustível para a vida deles. Expressem esse sentimento tocando em seus bebês, cantando para eles, conversando com eles, fazendo o Método Canguru e todas as outras formas de interação afetiva e presencial entre uma mãe de UTI e um filho prematuro.

E se você está produzindo o leite materno, mas não compreende porque o seu prematuro não está conseguindo sugá-lo diretamente de seu seio, aguarde o próximo texto. Explicarei alguns fatores que dificultam e muito o aleitamento materno diretamente dos seios no contexto da prematuridade, especialmente o da extrema.

Com amor, Teresa Ruas

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Teresa Ruas, a filha Maitê, o marido Marcel e o filho Lucca (Foto: Arquivo pessoal)

 

 

Teresa Ruas é terapeuta ocupacional infantil, organizadora do livro Prematuridade extrema: olhares e experiências e mãe de Maitê Maria e Lucca, que nasceram prematuros. É também autora do site Prematuros. Siga-a no Instagram @prematurosbr.



from Crescer https://revistacrescer.globo.com/Colunistas/Teresa-Ruas-Vida-de-Prematuro/noticia/2019/08/maes-de-uti-nao-basta-ter-amor-para-amamentar-diz-mae-de-dois-prematuros.html

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