A dificuldade para conquistar a filha caçula Gabi, 5 meses, é real para o designer e empresário Thiago Martins, 28. Mas ele não está só. A mesma questão é enfrentada por milhares de outros homens. “É complicado. O primeiro sentimento sempre é de impotência. Será que estou fazendo algo errado? Será que não sou um bom pai? Essas perguntas sempre surgem”, diz.
A relação de proximidade dos filhos com as mães, seja por uma ligação natural proveniente da gestação ou da presença mais constante, faz com que os homens se sintam perdidos nos primeiros anos de vida da criança.
O gerente de criação Rafael Ferreira, 28, pai de Caetano, 1 ano e 6 meses, viaja com frequência à trabalho e diz que, na volta, precisa ter paciência. “Fico de 4 a 7 dias sem vê-lo. É uma sensação estranha, pois, além de eu sentir muita saudade, quando nos encontramos parece que demora um certo tempo pra ele ‘me aceitar’ novamente. Dá um aperto no peito”, conta.
“Muitos pais acabam se afastando porque é mais fácil. Dá menos trabalho dizer ‘nossa, ele não me quer. Só quer seu colo, toma’ do que se esforçar para que essa relação comece a evoluir”, argumenta Thiago, que também é pai de Arthur, 2 anos.
Para ele, que compartilha as experiências da paternidade através do perfil @paijovem, infelizmente, ainda é mínima a participação masculina nos cuidados com as crianças. “A esmagadora maioria dos nossos seguidores são mulheres e isso passou a ser um ponto de motivação a mais para o meu trabalho: tentar de alguma forma cativar os pais pra mostrar como a paternidade é prazerosa, além de importante. Hoje, estamos no meio de uma revolução do papel paterno nas famílias e, com muito orgulho, tento fazer a minha parte nessa história”, afirma.
A CULPA É DAS MÃES?
Um novo estudo, publicado no Journal of Child and Family Studies, mostrou que os pais que se sentem julgados por suas habilidades tendem a se envolver menos com seus filhos. Ou seja, a causa desse afastamento pode estar relacionada ao que os pesquisadores chamam de “guarda materna”.
Esse hábito, segundo os cientistas, leva as mães a assumirem as atividades por acharem que os pais fazem errado. Em outros casos, elas criticam abertamente a maneira como eles trocam uma fralda, por exemplo. E isso, para os especialistas, é capaz de enfraquecer a confiança de um pai em torno da criança e levá-lo a evitar interações com o filho.
Contrariando o estudo, o psicólogo e terapeuta familiar, Alexandre Coimbra Amaral, diz que não se deve culpar as mães por uma relação de afastamento. “A única pessoa capaz de recuperar o vínculo com o filho é o pai. Isso tem que ser conquistado. O homem é co-responsável. Transferir essa culpa para a mulher é uma leitura machista que desresponsabiliza o homem”, defende.
Para Raquel Barboza Lhullier, psicoterapeuta Cognitivo Comportamental de crianças e adolescentes de Pelotas (RS), também existe um mito de que todas as mulheres sabem como cuidar do bebê. "As mães podem estar muitas vezes tão confusas sobre o que fazer como os homens”, pontua.
“Ainda temos uma cultura um tanto machista, que dificulta a vida dos homens que assumem os papéis de cuidadores”, diz, referindo-se, principalmente, ao tempo da licença-maternidade, que é de cinco dias para os pais. “Sabemos que o tempo em que o pai fica com a criança pode exercer um impacto sobre o que eles podem fazer pelas crianças, ampliando as possibilidades de explorar o lado afetivo emocional com os filhos”, completa.
O jornalista Marcos Piangers, pai da Aurora, 13, e Anita, 6, também acredita que a questão está relacionada a problemas culturais. “Percebo muito isso: mães que se sentem obrigadas a fazer tudo, porque era assim que sua mãe fazia. E como homens não são treinados ou incentivados a serem pais, nossa posição mais confortável é a da não participação. Somos criados desde pequenos para cumprir dois papéis no mundo: provedor e pegador. Os dois papéis nos afastam da família. Por isso, tantos pais se escondem no escritório nos primeiros meses dos filhos. É nosso lugar de conforto”, diz.
“Minha decisão foi fazer o contrário: me desafiar a estar em situações tipicamente femininas. Reuniões escolares, pediatras, brincadeiras de boneca. Só assim você conhece seu filho de verdade e constrói uma relação plena”, conta Piangers, que é autor de diversos livros sobre paternidade, como O papai é pop.
COMO É A NOVA PATERNIDADE?
Por outro lado, segundo Alexandre Coimbra, o simples fato de se sentirem frustrados com a “rejeição” dos filhos, já mostra que os pais estão preocupados. “Esse é um movimento novo. Eles não querem mais ser só provadores financeiros e patrimoniais da família, como no século passado. Eles querem participar e cuidar”, explicou.
Para o psicólogo, estamos diante de um fenômeno novo e, por isso, é natural que cause insegurança. O publicitário Bruno Santiago, 37 anos, é um exemplo. “Eu pesquisei muito como trocar fraldas, fazer papinhas, mas o conteúdo era sempre voltado para a mãe, nunca para o homem. Isso me incomodava bastante”, conta.
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Diante disso, ele, que é pai de Samuel, 5, deixou sua profissão de lado para criar o movimento “Pai tem que fazer de tudo”. Agora, Bruno se dedica a ministrar palestras e escrever sobre paternidade. “Meu avô só trabalhava e pagava as contas. Meu pai já veio mais adocicado e essa nova geração de homens está acordando pra importância de abraçar e beijar um filho”, disse ele.
“Tive a oportunidade de conduzir o desfralde do Samuel e tenho muito orgulho disso. Nós conseguimos o tão sonhado cocô, que ele fez tão fofo no penico de vaquinha, olhando para mim, segurando minha mão e fazendo força”, lembra. “Se não fosse o fato de dar valor mais ao tempo do que ao dinheiro, talvez eu teria perdido essa cena”, explica.
Bruno disse já ter enfrentado diversos “olhares engraçados” em locais públicos. “Simplesmente por que eu trocava fralda do meu jeito, rápido, enquanto outras mães demoravam demais. Elas deviam pensar - Mas como ele já limpou? Que cara esquisito. Aposto que não limpou direito”, diverte-se.
E QUANDO O PAI É MAIS PRESENTE QUE A MÃE?
Na casa do estudante Eduardo Costa, 37 anos, quem toma conta da rotina de Maria Antonia, 4, e Maria Eduarda, 3, é ele, enquanto a esposa Simone Chagas, 38, trabalha. “Quando minha filha completou dois meses, Simone precisou voltar ao trabalho e eu assumi tudo. Foi uma decisão nossa. É bem cansativo, mas eu gosto muito, muito mesmo”, diz.
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“Ela fica ausente fisicamente, mas não deixa de ser mãe em nenhum momento. Eu não faço nenhuma tarefa de mãe, até por que, a gente acha que não existe isso. Não existe função de pai e função de mãe. Exceto parir e amamentar”, explica.
Eduardo ou @paidasmarias, como é conhecido nas redes sociais, faz parte do grupo ainda limitado de homens que falam sobre paternidade nas redes sociais. “É difícil sentar com três ou quatro amigos pra falar sobre paternidade. Acho que a rede social faz essa aproximação, possibilita a troca de ideias”, comenta.
“A maior preocupação deles é se estão fazendo certo. Eles têm medo da reclamação das esposas. Todos temos, né? Eu costumo dizer que as esposas são auditoras em certos momentos. Elas estão ali só para verificar se estamos fazendo certo”, brinca.
PAI E FILHO: COMO MELHORAR O RELACIONAMENTO?
Para o psicólogo Alexandre Coimbra, dedicação é a palavra-chave para conquistar a confiança dos filhos. “Você só consegue ser uma figura de referência se está com a criança no momento em que ela está bem. Por exemplo, brincar, correr e ouvir as histórias da vida dela. Só então, vai ganhar o aval pra cuidar dela em um momento de angustia”, explica.
“O pai vai ter, sim, que fazer um tempo de quantidade e qualidade. Não é por que estamos trabalhando muito mais que os nossos pais e avós que as crianças precisam menos tempo de nós. O que acontece é que compartilhamos os filhos com outras pessoas, como babás, avós e escola. Eles estão criando intimidade com outros adultos”, diz.
O especialista ainda contou sobre uma situação comum em seu consultório: “Quando tem um problema com uma criança, eu chamo todo mundo e faço uma pergunta aberta para todos. A resposta mais precisa, acredite, é sempre da babá. Ela responde certeira e isso causa muito constrangimento”.
Por isso, segundo o psicólogo, os filhos precisam ser prioridade. “Quando não estamos trabalhando, temos de estar com eles, principalmente nos primeiros anos de vida. Esses precisam ser de concessão para a construção desse alicerce de segurança”, disse. Mas ele chama atenção à questão da “parentalidade distraída”, que é a presença “meia boca”, como brincar com o filho, mas de olho no celular. “A criança sabe estar presente, por isso, ela nota. E o que importa é o que ela acha”, concluiu.
“Meu filho não saiu da barriga da minha esposa me amando e já escrevi uma vez que eu também não o amava quando nasceu. São os dias juntos, as trocas de olhares, de toques e a convivência que vão construir o relacionamento entre os dois”, ensinou o pai Thiago Martins. "Tenho me tornado pai a cada dia, a cada experiência vivida, a cada abraço e a cada momento que passamos juntos”, finalizou Rafael Ferreira.
“A mãe nasceu depois daqueles nove meses. O pai deveria engravidar junto. Tantos homens apenas se percebem pais depois do parto. Os nove meses são a preparação para isso. Acompanhar a esposa em tudo, passar mais tempo em casa, parar de beber álcool, assim como ela está fazendo, sair menos com os amigos para ter nesses nove meses a chance de organizar a futura rotina, se preparar para as mudanças que estão vindo”, orientou Piangers.
Confira outras dicas da terapeuta infantil Raquel Lhullier:
• Promova atividades positivas de engajamento com o seu filho como jogos, leitura ou esportes;
• Abrace seu filho, diga a ele o quanto é amado e importante sempre com elogios sinceros;
• Possibilite a realização de atividades que a afetem positivamente, mesmo sem o envolvimento direto com ele;
• Converse com a criança sobre temas importantes, sobre suas emoções e o seu cotidiano.
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