Monday, September 30, 2019

Conectados desde o berço

Cabe aos adultos monitorar o número de horas que os pequenos gastam com as telas (Foto: Getty Images)

 

Do momento que acordamos à hora de dormir, a tecnologia está presente em nossas vidas diariamente. Seja para fazer compras, checar a previsão do tempo ou entreter o seu filho na sala de espera do pediatra, hoje em dia, é quase impossível imaginar o dia a dia sem o apoio dos nossos smartphones e outros gadgets afins. Eles também acompanham os nativos digitais desde cedo, tanto na hora de brincar, quanto de estudar. Para você ter uma ideia, de acordo com um relatório do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), um em cada três usuários de internet no mundo é criança. Não dá mais, portanto, para imaginar o mundo de outro jeito. “Assim como foi com a TV e com outras ferramentas tecnológicas mais antigas, as atuais também podem gerar dúvidas a princípio. Mas, em vez de demonizá-las, temos de aprender a conviver e a tirar o melhor proveito delas”, afirma a psicóloga Andréa Jotta, do Laboratório de Estudos de Psicologia e Tecnologias de Informação e Comunicação da PUC-SP.

Mas é claro que a preocupação dos pais têm razão de ser. Segundo um documento da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), inúmeros estudos mostram a associação entre excesso de exposição a telas na primeira infância e atraso no desenvolvimento cognitivo e na linguagem, além de alterações de comportamento e de sono – uma pesquisa da Universidade da Califórnia em parceria com a Universidade de Washington (ambas nos Estados Unidos), por exemplo, mostrou que meninos que gastam mais de duas horas por dia com mídias sedentárias têm quase o dobro de chances de se tornarem obesos em comparação com aqueles que não ultrapassam duas horas diárias. De modo geral, esses prejuízos são consequência do uso precoce de dispositivos, da exposição a conteúdos impróprios e da diminuição da interação direta entre cuidador e criança (isso porque quanto mais tempo passa entretida com as telas, menos atenção ela recebe dos adultos). Como chegar a um equilíbrio, então?

Seja o exemplo

Para a psicóloga Andréa, a primeira coisa que os pais têm de fazer é perguntar a si a sua própria relação com a tecnologia. “Não adianta falar uma coisa e fazer outra. Cedo ou tarde, ela vai questionar porque as normas são diferentes para adultos e crianças, além de reclamar se os pais não tiram o olho do celular”, alerta. O que foi provado recentemente por um estudo da ONG Common Sense Media (EUA): 39% das crianças acham que os pais dedicam tempo demais aos aparelhos. Se você já ouviu esse tipo de comentário do seu filho em casa, fica a dica.

Também cabe aos adultos, claro, monitorar o número de horas que os pequenos gastam com as telas – veja no quadro abaixo a quantia ideal recomendada pelos pediatras, de acordo com a idade. “Uma rotina saudável deve incluir diversas atividades (dos esportes à lição de casa) de maneira equilibrada e cada família tem de encontrar o seu ritmo”, afirma a psicopedagoga Nathalia Pontes, coordenadora de pesquisa e desenvolvimento educacional da PlayKids. É assim que funciona na casa da organizadora de eventos Renata Bastos, 41, mãe de Nicole, 10, e Juan Carlos, 13. “A regra é que eles dividam o tempo de conexão entre TV, videogame e celular, incluindo também os estudos. Eles podem escolher qual usar, mas tem de ser dentro do horário combinado e respeitar o limite diário”, conta. Paralelamente, as crianças também têm aulas de esporte e música.

O pediatra Gustavo Moreira, do Instituto do Sono, da Unifesp, ressalta que os gadgets devem ser desligados pelo menos uma hora antes da criança ir para a cama. “A luz azul desses aparelhos interfere na produção de melatonina, hormônio responsável por induzir o sono”, explica. Por isso, nada de TV e celular no quarto, ok?

Segurança na rede

Não é só a quantidade de horas gastas em frente às telas que importa, mas o que chega até os pequenos por meio delas. “As famílias acreditam que, por estarem longe das ruas, as crianças já estão seguras. Sabemos que não é bem assim”, diz o pediatra, citando o “Desafio da Momo” (lenda urbana que se espalhou entre os jovens pelas redes sociais, em 2018, com mensagens de suicídio). Para garantir que seus filhos naveguem com segurança, saiba que existem inúmeras ferramentas que ajudam nessa tarefa – como o app Family Link, do Google, que permite que os pais estabeleçam não só o tempo que as crianças vão usar as telas, como o tipo de aplicativo que podem baixar; e o YouTubeKids, versão da plataforma de vídeos desenvolvida especialmente para os pequenos, que também oferece recursos de controle.

A psicopedagoga Nathalia reforça que, especialmente nos primeiros 5, 6 anos de vida, as crianças não têm a capacidade de decidir sozinhas o que vão acessar. Daí a importância do olhar atento dos pais. “Cabe a eles ensinar o ‘caminho das pedras’ aos filhos, para que eles se empoderem e ganhem autonomia. Assim, quando for a hora, vão saber decidir por si próprios e também reportar aos adultos caso algum conteúdo inadequado chegue até eles”, diz. Em resumo, nenhuma ferramenta de controle, por mais moderna que seja, substitui a supervisão dos adultos.

Para a especialista, as novas tecnologias estão aí para unir e, não, afastar as famílias. O que depende, obviamente, do uso que fazemos delas. “Que tal ajudar em uma pesquisa, ouvir música ou jogar com o seu filho?”, recomenda. Esse interesse vai fortalecer os vínculos entre vocês, além de fazer com que ele se sinta especial. “E, lá na frente, não é do celular de última geração que ele vai se lembrar, mas do momento que vocês passaram juntos”, conclui.

Tempo de tela

Para usar com moderação, veja o que recomenda a Academia Americana de Pediatria (AAP):

0 a 1 ano | Não se recomenda o uso
Dos 18 meses aos 5 anos | Uma hora por dia, fracionado ao longo do dia, com conteúdo pedagogicamente adequado à idade e nível de compreensão
A partir dos 6 anos | Cabe aos pais estabelecer o limite, sendo que o tempo usado para atividades escolares no computador, no caso de crianças mais velhas e adolescentes, fica de fora dessa conta



from Crescer https://revistacrescer.globo.com/Poder-do-colo/noticia/2019/09/conectados-desde-o-berco.html