O apocalipse é um tema recorrente no cinema. Ele já veio em forma de vírus criados em laboratórios, zumbis, catástrofes naturais, alienígenas, monstros dos mais diversos tipos e tamanhos, entre tantos outros. Em Tito e os Pássaros, porém, o que causa o fim da humanidade como conhecemos é o elemento em comum entre todas essas histórias e se parece muito mais com a realidade do que com a ficção: o medo coletivo.
Na animação nacional, que estreia nesta quinta (14), a sociedade fica à beira do caos depois do surgimento de uma doença misteriosa, conhecida apenas como “surto”, que faz com que as pessoas fiquem com olhos esbugalhados, batimentos acelerados e provoca uma paralisia progressiva até o ponto de transformá-las em pedra. Não se sabe ao certo como a contaminação ocorre, mas o medo é o gatilho das novas infecções que se alastram pelo mundo todo de forma desenfreada.
Em meio a áreas de quarentena e adultos paralisados, Tito, um garoto de dez anos, e seus amigos, a corajosa Sara, e o tímido Buiu, embarcam em uma perigosa jornada pela cidade em busca da cura da epidemia. No caminho, eles contarão com a ajuda do pai do menino, Dr. Rufus, um cientista que almeja criar uma máquina capaz de decifrar a linguagem dos pássaros, pois acredita que eles conhecem o antídoto para a doença.
Sucesso em festivais internacionais, Tito e os Pássaros foi um dos pré-indicados ao Oscar de Animação. De acordo com Gustavo Steinberg, diretor do longa ao lado de Gabriel Bitar e André Catoto, a cultura do medo, exacerbada pelo amplo alcance das mídias, é um dos temas centrais das sociedades ocidentais atualmente. “Cada um interpreta a história de um jeito diferente, de acordo com sua cultura. Quando apresentamos o longa nos EUA, alguns espectadores relacionaram a Trump e seu muro, na Europa, viram uma ligação com a aversão aos refugiados e aqui no Brasil já traçaram paralelos com a discussão sobre o porte de armas e o terror provocado pelo crime organizado”, afirma.
Apesar de abordar um tema sério e em grande sintonia com a atualidade, o filme toma os cuidados necessários para não ser aterrorizante ou inapropriado aos pequenos, evitando cenas violentas ou que provoquem sustos intensos. Para Denise Fraga, que dá voz a Rosa, mãe de Tito, o longa tem o potencial de motivar uma conversa proveitosa entre filhos e pais. “Quando nos tornamos mães, nosso potencial de absorver a cultura do medo aumenta porque começamos a pensar no que pode dar errado. A Rosa é um exemplo disso, dizendo para o Tito que ‘o mundo é muito perigoso’. Esse filme nos mostra que temos que ficar atentos, enfrentar o medo e ter a coragem de nadar além da rebentação porque é lá que a vida acontece”, conta.
Mas nem todo mundo está apavorado pelo “surto” na distopia de Tito e os Pássaros. O empresário Alaor, dublado por Mateus Solano, é um dos que encontrou no desespero alheio uma forma de lucrar. Em meio ao caos, seu objetivo é vender imóveis dentro do “Jardim Redoma”, um condomínio isolado que promete manter seus moradores seguros e sem medo. “A cidade deveria ser um espaço em que as pessoas se encontram e convivem de forma mais próxima, mas passamos a criar barreiras porque temos medo um dos outros. As crianças ainda vem essa relação de uma maneira diferente e falar com elas sobre esse assunto traz a esperança de mudança para o futuro”, diz Solano.
Com seu visual vibrante inspirado em artistas expressionistas, trilha sonora capaz de aumentar a tensão através das notas musicais e roteiro de estrutura simples, porém cheio de significado, Tito e os Pássaros pode ser apreciado pelo público de todas as idades. Uma ótima pedida para quem, além de se divertir, não perde a oportunidade de conversar com as crianças sobre o mundo em que vivemos e como é possível transformá-lo em um lugar melhor.
Assista ao trailer:
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