Talvez você tenha dedicado algum tempo da gestação para estudar sobre as fases do (temido) trabalho de parto sem jamais se preocupar com a (romantizada) amamentação. E agora existe um bebê esfomeado nos seus braços, diante de um seio ingurgitado (muito cheio) de leite, e algo parece não encaixar direito... Mas, afinal, não deveria ser um ato instintivo?
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“Perdemos a cultura da amamentação: hoje ela faz parte de um aprendizado”, afirma o pediatra Luciano Borges Santiago, presidente do Departamento Científico de Aleitamento Materno da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). “Embora seja simples, se alguns detalhes não forem seguidos, levam à armadilha do desmame.” Uma pega (quando o pequeno “abocanha” a aréola) incorreta, por exemplo, pode causar fissuras nos seios e baixo ganho de peso para o bebê – que não drena o volume de leite necessário por mamada. Quanto mais cedo o problema é detectado, mais fácil solucioná-lo.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que todas as crianças sejam amamentadas de forma exclusiva nos primeiros seis meses de vida e, como complemento alimentar, até os 2 anos ou mais. Há tempos, a ciência comprova benefícios do aleitamento, como fortalecimento do sistema imunológico, prevenção de problemas na fala e na arcada dentária, crescimento físico e desenvolvimento emocional mais saudáveis.
Um estudo recente do Instituto de Pesquisa Lunenfeld-Tanenbaum, no Canadá, afirma que ser alimentado com leite materno exclusivamente nos primeiros cinco meses de vida reduz o risco genético de se tornar obeso mais tarde. Até mesmo mães com covid-19 devem continuar amamentando – não há pesquisas que comprovem a transmissão do novo coronavírus por essa via e, por outro lado, sabe-se que os anticorpos protetores são passados para o bebê pelo leite materno.
A seguir, fique por dentro dos principais sinais de que você está em um bom caminho para amamentar o seu bebê.
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1- Vocês se posicionam confortavelmente, e barriga com barriga Suas costas e braços devem estar apoiados – afinal, é provável que você fique entre 20 e 40 minutos (quase) sem se mexer. Recorra a travesseiros ou almofadas para evitar dores lombares e cervicais. Só então o bebê deve ser levado ao peito, colocado de frente, encostando a barriga dele na da mãe.
“Ele não é só boca: precisa estar com a cabeça, o pescoço e a coluna alinhados para fazer uma boa pega”, afirma a pediatra Honorina de Almeida, especialista em aleitamento materno, da Casa Curumim (SP). “Nada de corpo girado, braço jogado para trás, perna muito solta...”. Como os bebês são bastante sensíveis ao contato pele a pele, a médica indica o mínimo de roupa durante as mamadas. Se estiver frio, você pode aquecer o ambiente ou colocar uma manta sobre ele.
“Valentin nasceu com o freio curto, o que dificultou a pega e machucou meus seios. Com uma semana, a odontopediatra fez o ‘pique’ na língua e melhorou muito. Outro problema foi que meu peito empedrava. Meu marido ajudava a massagear porque doía demais e, com indicação da consultora de amamentação, eu ordenhava antes de cada mamada para que nosso filho conseguisse pegar o bico. Deu certo: ele segue mamando depois de um ano.”
CAROLINE REIGADA, 32, MÃE DO VALENTIN, 1
2- O bebê abre bem a boca O bebê abre bem a boca e fica com “lábios de peixinho”
Algumas mães seguram a mama por baixo, com a mão em forma de “C” e o polegar por cima. Outras preferem apenas aproximar o bebê com a mama “solta”. Seja como for, o importante é que ele esteja com o queixo levantado, os lábios na altura do mamilo e abra bem a boca.
“Observe se a língua dele rebaixa para abocanhar a aréola por completo – ou, no caso de uma aréola grande, se cobre mais a porção inferior que a superior”, diz a enfermeira obstetra Patrícia Scalon, especialista em amamentação e criadora do @cuidardobebe no Instagram. Isso porque a mandíbula debaixo do bebê é que ordenha o leite. Se a boca estiver mais fechada, apenas sugando o bico ou com os lábios voltados para dentro, ele não vai extrair o suficiente e ainda pode machucar a mãe. Nesse caso, Patrícia recomenda retirar o recém-nascido do peito: você pode colocar o dedo mindinho no canto da boca dele para “tirar o vácuo” da pega e reposicioná-lo, inclusive ajeitando com delicadeza o queixo mais para baixo e virando os lábios para fora.
3- O movimento do maxilar é ritmado
Quando você olha para o bebê, ele está com as pontas do nariz e do queixo levemente encostadas na mama. Os primeiros movimentos de sucção serão curtos e rápidos para
estimular a descida do leite – e porque ele está ansioso, com fome! Assim que o líquido flui até o mamilo, o pequeno passa a sugar de forma mais lenta e profunda, com algumas pausas para engolir. Você pode perceber o maxilar se mexendo e, às vezes, reverberando nas orelhinhas dele. Talvez consiga até ouvir os goles! Ao final da mamada, eles deglutem menos e sugam para relaxar.
“No terceiro dia da minha filha, meu peito começou a doer demais: além da apojadura [processo de produção e descida do leite depois do parto], que me deixou cheia de nódulos, estava com fissuras pela pega errada. Os primeiros 15 dias foram muito difíceis. Enquanto ela mamava, eu chorava e tremia de dor, os mamilos sangravam e demoravam a cicatrizar. Com o apoio do meu marido e da consultora de amamentação, superei tudo e amamentei Lara até os 8 meses.”
BRUNA TURCÍLIO FERREIRA, 32, MÃE DA LARA, 1
4- Não tem barulho de estalo nem “covinhas” na bochecha
Ambos significam que o bebê está engolindo ar. “Sinal de que não conseguiu fazer a pega direito, e tem um vácuo que atrapalha a boa ordenha”, afirma a enfermeira e consultora em aleitamento materno Eneida Souza (SP). “Ou seja, ele faz força e não extrai o volume de leite que poderia.” É preciso reposicioná-lo. Se o problema continuar, marque uma consulta com o pediatra ou outro profissional especializado para avaliar se o bebê tem, por exemplo, o freio lingual curto, que dificulta a pega e faz com que ele precise fazer mais força com a língua para extrair o leite.
5- Você não sente dor – talvez um desconforto inicial
Maior sensibilidade nos mamilos, sensação de a pele estar sendo esticada e um certo incômodo são normais no início da amamentação. Segundo a pediatra Honorina de Almeida, tudo isso deve ser algo suportável nos primeiros trinta segundos de mamada. Se a dor persiste, retire o bebê e tente uma nova pega. Quando o bebê sair do peito, preste atenção ao formato do seu mamilo.
“Ele deve estar redondo e não amassado ou achatado como um batom”, diz a enfermeira obstetra Patrícia Scalon. Em caso de complicações, como fissuras, lanolina e tratamento com laser – indicados por especialistas – aceleram a cicatrização. Outro ponto: o organismo da mãe leva entre seis e oito semanas para começar a regular a produção de leite, adequando a oferta à demanda. Ao longo desse período, é comum que as mamas fiquem ingurgitadas, ou seja, “cheias e duras”. Para aliviar o desconforto e amaciar a aréola, você pode ordenhar um pouco a mama com a mão antes de oferecê-la ao bebê. Depois da mamada, faça uma compressa fria nela.
6- O bebê mama com muita frequência
No útero, o bebê desconhecia o conceito de fome. Então ele nasce, tem o cordão umbilical rompido... e seu estômago corresponde ao tamanho de uma cereja – com capacidade para cerca de 7 ml de leite. Em uma semana, equivale a uma ameixa (45-60 ml). Graças ao seu metabolismo e às suas proporções, ele não pode ingerir tudo que precisa em três refeições.
“Nos primeiros dias, o bebê deve ir para o peito entre oito e 12 vezes”, afirma a pediatra Honorina. “Ele não deve passar de três horas sem mamar, porque corre o risco de hipoglicemia.” Sim, talvez você tenha de atrapalhar o sono do seu recém-nascido. Mexa nos pés, troque a fralda, tire peças de roupa se for preciso. A cada mamada, ele deve sugar ativamente por, pelo menos, 15 minutos. Caso adormeça antes, faça compressões na mama para injetar mais leite e animá-lo. Não se preocupe em cronometrar com rigor o tempo que passa no peito, porque isso varia muito entre os bebês.
“Da mesma forma que alguns adultos almoçam correndo e outros, comem devagar”, diz o pediatra Luciano Borges Santiago.
“A pega da minha bebê foi boa desde o início, mas sempre sofri com muita sensibilidade nos mamilos. Tive fissuras, mas as sessões de laser com a consultora de amamentação ajudaram a cicatrizar. Depois veio a descida do leite e vários ductos entupiram. Ela ensinou a ordenhar melhor e a botar a Alice em outras posições para mamar. Ainda tive candidíase mamária e tratei com antifúngico. Valeu superar os primeiros 20 dias: amamentar virou um prazer e sei o bem que estou fazendo à minha filha, que ainda está em livre demanda.”
PATRICIA FIENI, 31, MÃE DA ALICE, 1
7- A mama fica mais macia e leve Ao contrário da mamadeira, o seio não é transparente nem vem com marcações para que as mulheres saibam quantos mililitros de leite foram consumidos por mamada. Esse “mistério” faz com que muitas mães fiquem inseguras sobre a própria produção e a ingestão do bebê. A consultora Eneida de Souza dá uma dica simples, mas preciosa: “A mãe pode apalpar a mama e sentir seu peso antes de oferecê-la para comparar ao final da mamada – assim saberá se ela esvaziou ou não”.
8- O bebê relaxa - e até solta as mãos! Um recém-nascido esfomeado tende a ficar com os punhos fechados ou, concentrado na sucção, esticar bem os dedos. Quando as coisas estão no caminho certo, à medida que enche a barriga, ele se acalma. Suas mãos abrem e se soltam, relaxadas. Já ouviu a expressão “bêbado de leite”?
O pediatra Luciano Santiago dá outra razão para a moleza: “Ao final de uma mamada, o bebê costuma ficar sonolento também porque é um exercício... e cansa”.
9- Você troca várias fraldas Como explica a enfermeira e consultora de amamentação Patrícia Scalon, 85% do leite é composto por água: ou seja, a frequência de xixi é um ótimo indicador da hidratação do bebê. Nos primeiros cinco dias, espera-se que ele molhe bem seis fraldas – no mínimo. Repare também se a urina não tem cor amarelo-ouro, sinal de que está concentrada. A consistência do cocô do recém- nascido muda de “piche” (escuro e pegajoso), nas primeiras 48 horas, para algo mais amarelo e líquido.
10- O ganho de peso é evidente nas consultas Calma, a maioria dos bebês perde peso logo após o nascimento e leva de duas a três semanas para recuperá-lo. O monitoramento na balança do pediatra é um dos “termômetros” mais objetivos sobre o êxito da amamentação. “Se o recém-nascido está engordando bem, a primeira conclusão é de que ele não está passando fome”, diz o pediatra Luciano Santiago.
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from Crescer https://revistacrescer.globo.com/Gravidez/noticia/2020/08/10-sinais-de-que-amamentacao-esta-no-caminho-certo.html