“Sempre joguei futsal, desde os meus 11 anos. Mas, depois de muito tempo, parei de praticar o esporte e tive minhas duas meninas, a Maria Clara, 4 anos, e a Laura, 3.
Na primeira gravidez, fiquei bem focada na maternidade. Foi um período muito intenso, porque, além de ser mãe de primeira viagem, também fiquei grávida da Laura quando a Maria Clara tinha 11 meses. Foi aí que eu senti a necessidade de dedicar um tempo a mim mesma. Depois da segunda gestação, a maternidade foi muito mais leve e eu já me sentia mais tranquila para começar esse momento mais meu.
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Quando a menor tinha 5 meses, conheci a Roseane, paciente do meu marido, que, mais tarde, se tornou minha amiga. Ela sabia que eu jogava bola quando eu era nova e, então, perguntou se eu tinha interesse em entrar em um time de futsal feminino da nossa cidade, o Fridas [cujo nome é uma homenagem à pintora mexicana Frida Kahlo]. Fiquei bem interessada, mas, naquela época, eu ainda estava em amamentação exclusiva, então, esperei passar os primeiros seis meses para introduzir outros alimentos à Laura antes de começar a participar dos treinamentos do time, que já estava competindo a todo vapor em competições intermunicipais. Como eu estava com duas pequenas, emendei uma amamentação na outra. Foi um ciclo bem puxado — quem vive, sabe —, mas a vontade era maior e o apoio das meninas do time me deu forças para continuar esse tempo todo.
Eu me apaixonei completamente pelo Fridas e pelo esporte, mesmo ainda não participando dos campeonatos, algo que foi acontecer apenas no ano seguinte, em 2017. Nosso time é muito ativo na nossa cidade — Jaguarão, no Rio Grande do Sul — e entrou em quadra com placas de não à violência, não à agressão, não às drogas. Composto por mulheres de todos os tipos — casadas, solteiras, com ou sem filhos —, todo mundo trabalha muito e se vira para encontrar um espacinho na agenda para encaixar o esporte. A partir de 2017, completamente vinculada ao time, comecei a participar dos treinos, que acontecem entre às 22h e 23h. Para ter esse momento para espairecer a cabeça, contamos também com a ajuda dos maridos (que também atuam na comissão técnica do time), das famílias e de toda a comunidade, que frequenta os jogos e apoia bastante o futsal feminino em Jaguarão.
Falando em apoio, eu sou especialmente grata à minha mãe, que desde guria me deixou livre para praticar o esporte, o que me permitiu conviver com muitas pessoas diferentes e não viver em um mundinho só. Hoje, sou bioquímica e trabalho com ela em um laboratório privado. Ela coordena o meu trabalho e, por isso, me permitiu ficar seis meses de licença e trabalhar durante um tempo por meio período para cuidar das minhas duas filhas pequenas. Agora, o esporte é também uma paixão compartilhada entre as minhas gurias.
No seu aniversário de três anos, vi a Laura correr vestida de princesa para ir jogar bola com os amigos. Uma frase que me marcou muito foi da Maria Clara, que uma vez chegou em mim e comentou: "Mamãe, tu sabia que os meninos também podem jogar futebol?" Como ela vê a mãe jogando e o pai não, a impressão que ficou para ela foi que jogar bola é coisa de mulher. E é mesmo! É para quem quiser!
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No dia 10 de novembro de 2018, eu estava jogando em quadra durante um campeonato quando, infelizmente, lesionei o menisco e rompi um ligamento. Agora em janeiro, já passei por uma cirugia e estou em repouso absoluto por duas semanas. Antes de entrar em quadra novamente, farei um longo tratamento para me recuperar. Enquanto isso, vou voltar a frequentar congressos da minha área e dar início à uma pós-graduação, porque, nesses últimos cinco anos, a carreira acabou se limitando ao trabalho.
Além da saudade do esporte, tenho que lidar com comentários negativos, de repreensão. Há quem diga que me lesionar foi uma irresponsabilidade da minha parte e que, por ter duas filhas, eu não poderia me arriscar. Mas, se a gente olhar para os casos em que os homens são operados por que se machucaram em campo, não vamos encontrar tantas críticas. Até brinquei: "Que pena que eu rompi o meu ligamento jogando bola, porque, se eu tivesse rompido meu ligamento lavando uma janela, todo mundo ia ter pena."
Eu não concordo nem um pouco que nós mulheres devemos deixar de fazer coisas pelos riscos envolvidos. Na minha vida, eu ainda coloco as minhas filhas em primeiro lugar ou pelo menos junto comigo. Mas se focarmos só na maternidade, não conseguiremos dar o nosso melhor. Se a gente não tiver uma válvula de escape, algo que nos preencha de verdade, vai faltar um pouco de paixão, paciência e alegria. Por isso, precisamos ter esses momentos para nos sentirmos satisfeitas. Algo que compense as dificuldades, porque a gente oscila muito, se culpa muito, fica com medo, passa nervoso. Momentos como esse nos ajudam a ser mais leves em casa".
Beatriz Soares Moreira, mãe de Maria Clara, de quatro anos e nove meses, e Laura, de três anos
Grave ou relate a sua experiência também e poste nas redes sociais usando a hashtag #MeuMomento. É falando sobre o assunto que conseguiremos desmistificá-lo e ajudar as mulheres a se enxergarem além da maternidade.
from Crescer https://revistacrescer.globo.com/Meu-momento/noticia/2019/01/meumomento-se-focarmos-so-na-maternidade-nao-conseguiremos-dar-o-nosso-melhor.html