A última consulta com a pediatra deixou a publicitária Juliana Paula Koch, 28, de cabelo em pé. Ao contar que o filho Theodoro, de 3 anos e meio, ainda mamava no peito cerca de 3 vezes ao dia, a orientação da médica foi fazer o desmame de forma abrupta. "Ela disse pra colocar um curativo no peito e fingir dor. Eu odiei esse comentário e senti que ela não estava pronta pra me atender. Meu filho tem 3 anos e meio e mama apenas no peito, nunca usou chupeta e nem mamadeira", diz a mãe.
Revoltada, ela dividiu a frustração com um grupo de mãs nas redes sociais. Não demorou muito para que surgisse todo tipo de comentário. Algumas, deram força: "Infelizmente a maioria dos pediatras são assim, principalmente em relação a amamentação prolongada. Passei por isso. Tive péssimas experiências por conta disso", escreveu uma. "Fuja dessa médica. Quando vocês se sentirem preparados, o desmame deve ser gentil e amoroso", orientou outra. Algumas concordaram com a pediatra: "Gente, mais três anos já deu, né?", disse. "Desculpa, mas amamentar com 3 anos e meio não acho normal", criticou outra.
Mas não foi só isso. Segundo Juliana, a pediatra ainda argumentou que Theodoro poderia ter "traumas, problemas psicológicos, atrasos emocionais e usá-la como muleta pra tudo", caso ela não fizesse o desmame. "Fiquei chocada. Sai do consultório chorando, me assustou muito. Sendo que ela mesmo disse que ele está supersaudável", desafaba. "Sem contar as milhões de amostras grátis de fórmula que ela me deu. Disse que com isso ele conseguiria todas as vitaminas que precisa e que meu leite hoje é só água. Ele come de tudo, todo tipo de fruta, legumes... Nunca teve problema com nenhum alimento. O ganho pra mim é a imunidade dele que é maravilhosa", afirma Juliana.
Existe limite para a amamentação?
Segundo a pediatra Elsa Giugliani, presidente do Departamento de Aleitamento Materno da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), cada criança tem o seu tempo, ou seja, não existe uma data limite para o desmame. "A recomendação oficial é aleitamento materno por dois anos ou mais. Mas, em média, vários estudos mostram que o desmame varia entre 2 e 4 anos. Mesmo assim, não quer dizer que uma criança com mais de quatro anos que ainda amamente seja anormal", afirma.
Quanto a orientação para usar um curativo, a pediatra foi bem clara. "Não recomendamos essas estratégias para o desmame. Tem gente que finge estar doente, coloca remédio, pimenta... isso tudo é desaconselhável. Somos radicamente contra enganar a criança. Elas tem uma sensibilidade muito grande e sabem que estão sendo enganadas. Isso pode causar um trauma", explica Elsa.
O ideial, diz ela, é o desmame natural. Elsa explica que tanto a mãe quanto a criança, ao longo do tempo, vão perdendo o interesse naturalmente. "As crianças passam a ter outros interesses e entendem melhor essa separação com a mãe. Já a mulher, aos poucos, vai dando sinais para a criança de que está na hora de começar o desmame, que não é um ato e sim um processo", afirma.
Ainda de acordo com ela, mesmo nos casos em que o desmame seja aconselhável, ele jamais deve ser feito de forma abrupta. "Cada caso deve ser analisado individualmente pelo pediatra. Algumas vezes, uma dificuldade emocional pode estar impedindo o desmame, por exemplo, e isso tem que ser trabalhado de maneira gradual. Uma criança com mais de 2 anos já tem um entendimento, é capaz de dialogar, a mãe já consegue negociar", explica.
Meu leite é só água?
Mas será que o leite, mesmo aos 2, 3, 4 anos de idade, ainda alimenta? A resposta é sim! "O leite materno alimenta, é nutritivo, sim, em qualquer idade! Ele não é inferior a qualquer fórmula. Nesse caso, se a criança está mamando de 2 a 3 vezes ao dia, está perfeito. Ela pode continuar. É claro que essa recomendação depende do contexto de cada criança. Cada caso precisa ser analisado, mas quando está tudo bem do ponto de vista nutricional, não tem restrições", explica a pediata e nutróloga da Associação Brasileira de Nutrologia (ABRAN), Elza de Mello.
A Sociedade Brasileira de Pediatria também é categórica sobre esse assunto. "O leite humano é uma substancia viva, tem uma série de benefícios. Além de diversos nutrientes, ele protege, possui componentes de proteção que não tem em nenhum outro alimento. Esse argumento de que é o leite é só água nessa fase é infundado", esclarece a pediatra.
"O cuidado seria com as mamadeiras, seja de leite de vaca ou fórmula, que não devem substituir uma refeição. Amamentação prolongada complementando adequadamente a alimentação não tem nenhum problema", finaliza a nutróloga.
Cada filho, uma experiência!
Nem sempre é possível acertar na primeira experiência. A empresária Lais Queluz, 41, diz que errou com o primeiro filho, Vitor Hugo, hoje com 11 anos. "Desmamei ele aos 2 anos e dois meses de forma abrupta. Fiz isso por causa de tanta interferência externa: família, amigos, desconhecidos... sempre julgando que era desnecessário amamentar um menino 'criado'. Cheguei a pintar os seios com sombra preta e dizia que estavam machucados", lembra ela. "Depois, me arrependi. É traumatizante. A criança não entende o porquê de um dia para o outro perder aquilo: o aconchego, o carinho, o colo. Achei péssimo, pois não o via preparado", admite.
Com a caçula, Melissa, 5, ela conseguiu fazer diferente. "Eu tinha mais maturidade e não me importei com as críticas. Ela mamou até o dia que fez 4 anos. Desmamou sozinha, sem traumas ou rupturas. Ela virou para mim e falou: Mamãe, agora eu já sou uma princesa. Não preciso mais de 'tetê', e nunca mais quis o peito", conta. "Foi a melhor coisa que poderia ter feito por nós", afirma. A mãe ainda deixa um conselho para quem está passando por esse momento: "Se você acredita nisto também, vá em frente".
Em caso de dúvidas, a Sociedade Brasileira de Pediatria orienta as mães a buscarem profissionais especializados em aleitamento materno para que possam tirar suas dúvidas, avaliar o caso e auxiliar a melhor maneira de conduzir o desmame, se necessário.
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