Estar grávida é... Contar a vida em semanas. De uma hora pra outra, isso faz o maior sentido. Enquanto tantas outras coisas não fazem sentido algum...
Ter uma notícia dessas e não poder sair contando?? Ainda mais sendo jornalista. É um teste de resistência, de paciência, um cuidado pra não se precipitar. Justo eu, a imediatista. A impulsiva. A que fala mais que a boca.
Mas o bocão permaneceu fechado mesmo quando o teste de farmácia deu positivo. Não falei nada pro meu marido, pra evitar o risco de alardear o que poderia não passar de alarme falso. E mesmo quando consegui entender que o resultado exame de sangue significava positivo, aguentei cinco horas - com sensação de que eram 50 – pra contar pessoalmente. Não dava pra ser por telefone. Não podia abrir mão de ver a cara dele!
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O jeito era preencher as horas. Imprimi o exame de sangue, juntei a fitinha do teste de farmácia com os dois risquinhos, botei num envelope, imprimi uma etiqueta com nome e endereço da minha casa (não podia ser minha letra no envelope) e quando o max chegou, suado da academia, aflito por um banho... Esperei. Tirei proveito do tempo dele no chuveiro pra posicionar uma câmera. E fiquei lá, com cara de paisagem, torcendo pra que ele encostasse naquele ponto específico do balcão, pra eu poder finalmente dizer:
- amor, chegou correspondência pra você.
- ihhhhh... Deve ser bucha!
Pensei: não deixa de ser...
Ele abriu o envelope e, quase que ao mesmo tempo, abriu a boca. Abriu caminho pros olhos encharcarem. E pra cabeça começar a se encher de pensamentos e preocupações inéditas.
Passado aquele primeiro diálogo básico (- é verdade? - é! - tem certeza? - sim!), era hora do jantar.
- mas o que você deve comer? Toxtex faz mal? Queijo? Ovo pode?
- pensei numa salada de atum...
- melhor não! Acho que nem atum, nem salada.
- será?
Era um tanto de serás naquelas duas cabeças....
Dá-lhe doutor Google. Dá-lhe blogs de grávidas. E dá-lhe anúncios de fralda pipocando nos posts patrocinados nas redes sociais.
“Até o facebook sabe que eu tô grávida e minha mãe ainda não. E nem meu pai. Nem meu sogro, que é médico obstetra e fez nascer meia Botucatu!”
Isso me fez lembrar uma história que é clássico no meio da comunicação e do marketing. Reconto pra vocês do modo como me lembro dela (ou seja, “pode conter imprecisões”. Ainda mais vindo do cérebro de uma gestante): uma rede norte-americana de lojas sabia sobre a gravidez de uma adolescente antes mesmo do pai dela saber. O homem apareceu na loja revoltado porque viu que entregaram pelos correios cupons de desconto pra compra de berço e roupas de bebê. Destinados à filha dele, uma menina que ainda estava na escola. E a loja mandando esse tipo de oferta... Um absurdo!
- querem que ela fique grávida??
O gerente da loja se desculpou.
Mas dias depois, foi o pai que teve que se redimir. Ela estava grávida. E como a loja sabia?
O que a gente pesquisa na internet deixa um rastro que forma um padrão. E grávidas têm um padrão de pesquisa. Digitam ácido fólico. Ômega 3. Vitamina D. Creme para estrias. A combinação dessas palavrinhas faz muito sentido quando convertida em algorítmos. É o big data. O resultado do doutor Google é “positivo”. E sai mais rápido que o teste de farmácia.
Portanto, dona grávida, se quer guardar segredo, pega esse conselho: toma cuidado com o histórico de navegação na internet!
A mim, coube tomar cuidado pra não antecipar a notícia em forma de um fora.
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Exemplo?
Minha diarista precisou ficar umas semanas fora por causa do pai doente. Imagina o seguinte diálogo com a minha mãe, ainda sem saber que iria ser vovó:
- pois é, mãe.. Ela só volta no mês que vem.
- nossa, que puxado ter que trabalhar fora e ainda limpar a casa...
- então... Ainda mais agora!!
- ainda mais agora que o quê? Porque agora??
Cri cri cri.
Foi por pouco, muito pouco que diálogos como esse não aconteceram.
Na casa de um casal de amigos, foi difícil não deixar escapar. Era uma noite gostosa, de reunião entre amigos pra comer, beber vinho...
E eu, que troco quase tudo nessa vida por uma taça de vinho tinto, ia dizer o que? Que tinha parado de beber? Que tinha feito promessa pra santo?
Decidi justificar de outro jeito:
- É que ontem tomamos um vinho que estava aberto lá em casa e não caiu bem... Tô meio de ressaquinha.
E minha amiga:
- Olha lá, hein?! Quando vinho começa a cair mal, pode ser gravidez!! Hahahaha
Senti meu rosto do tom do vinho que não iria tomar. E fiquei muda, aquela risadinha de quem não sabe o que dizer. Detalhe: aquela festinha era pra essa amiga anunciar que... Estava grávida!!!
Das coincidências deliciosas da vida. Imagina como foi difícil guardar a notícia? Mas engoli ela. A seco. Sem vinho.
Primeiro porque aquela era a noite deles de contar a novidade.
Além disso, achei mais prudente deixar pra depois que as primeiras semanas, que podem ser mais críticas, estivessem superadas.
O jeito era esperar mais um pouco.
Pelo menos algo mais que oito semanas.
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