Nós, pediatras, passamos décadas recomendando que a comida do bebê não leve sal nem açúcar. Costumamos dizer: “separe a parte do bebê antes de acrescentar o sal à comida”.
Mas a comida “especial para bebês”, incluindo aquelas que são vendidas na farmácia, levam sal e levam açúcar. Cheque os rótulos: habitualmente, os cereais em pó têm muitíssimo açúcar, e as papinhas em purê com carne, peixe e verdura têm um pouco de sal. Quando o bebê experimenta um desses alimentos, acha que são mais gostosos que a comida caseira, porque nós gostamos de sal e de açúcar. Esse é o problema.
Gostamos de açúcar porque não há nada mais doce na natureza do que o leite materno (que tem mais lactose do que leite de vaca) e as frutas. Nossa preferência por doce levava nossos antepassados, há milhões de anos, a comer alimentos saudáveis.
Gostamos de sal porque, na natureza, o que há de mais salgado são as carnes e os peixes, ricos em ferro e vitamina B12. Nossos antepassados comiam carne, quando conseguiam, como fazem hoje os chimpanzés.
A natureza não havia previsto que chegaríamos a produzir sal e açúcar puros e baratos e que enganaríamos os instintos de nossos filhos com refrigerantes e guloseimas cem vezes mais doces que as frutas, e com batatas fritas e pré-cozidas cem vezes mais salgadas que a carne.
O sal e o açúcar não são especialmente perigosos para uma criança pequena. A partir dos seis meses, o bebê pode comer mais sal (proporcionalmente ao seu tamanho, é claro) que um adulto. O sal e o açúcar não vão intoxicar seu bebê. O que nós, pediatras, pretendemos é que as crianças das novas gerações se acostumem desde pequenas a comer menos sal e menos açúcar para que, quando forem maiores, comam de maneira mais saudável.
Fracassamos. Onde estão esses adolescentes que comem pouco sal e pouco açúcar? Depois de décadas de conselhos pediátricos, os jovens estão se alimentando mal como nunca, porque não adianta nada comer sem sal e sem açúcar durante seis ou doze meses, para depois acabar consumindo diariamente e por anos refrigerantes, sucos artificiais, biscoitos, batata frita, salgadinhos, guloseimas, pastéis e outros alimentos ultraprocessados.
Por isso, o que recomendo aos pais agora é: “Comam vocês com pouco sal e com pouco açúcar, e seu filho pode comer o mesmo desde os seis meses”. Mudar a dieta dos pais, alimentar-se bem a cada dia e para sempre, sim, vai melhorar a saúde de toda a família a longo prazo.
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