
A amamentação é um período muito desafiador para as mães. Afinal, assim como na gestação, as mulheres devem tomar certos cuidados, principalmente com relação ao uso de medicamentos. Por isso, é muito comum que algumas lactantes recorram a conteúdos na internet para tirar dúvidas.
A plataforma e-lactancia — ferramenta que avalia a compatibilidade do aleitamento materno com medicações, fitoterápicos e outros produtos — é muito procurada para consulta. Mas será que as famílias podem usá-la?
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O que é a e-lactancia?
Primeiramente, é importante entender como funciona a plataforma. A plataforma surgiu como uma forma de disseminar informações sobre a compatibilidade da amamentação com certos medicamentos, substâncias vegetais, contaminantes, cosméticos e até mesmo doenças. Ao todo, são 41.214 termos disponíveis para consulta.
A “sementinha” do projeto surgiu em 1999. Devido às frequentes dúvidas que recebia, o médico José María Paricio idealizou um banco de dados sobre a compatibilidade da amamentação, a princípio, com:
Medicamentos
Plantas
Substâncias tóxicas e doenças
O projeto foi lançado oficialmente em 2002 com a colaboração dos profissionais do serviço de Pediatria. Após uma reestruturação em 2012, a plataforma passou a ser mantida pela associação APILAM — Associação para a Promoção e Pesquisa Científica e Cultural do Aleitamento Materno.
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Posso usar a plataforma para fazer consultas?
A própria APILAM, em seu site, recomenda que a ferramenta seja utilizada exclusivamente por profissionais de saúde especializados. “Se você é mãe, pai, avô ou avó, consulte seu pediatra, parteira, ginecologista ou outros profissionais comprometidos com o cuidado da díade mãe-bebê e com a saúde e o bem-estar da criança”.
Moises Chencinski, pediatra e colunista da CRESCER, reforça essa recomendação. “As plataformas podem ser usadas por pessoas leigas para obter uma informação que deverá ser checada, por segurança, com o profissional (médico) que faz o acompanhamento. Em caso de dúvidas, a mãe deve recorrer ao profissional com a informação para entender melhor a prescrição”, enfatiza o especialista.
Cinthia Calsinski, enfermeira obstetra e consultora de amamentação, também enfatiza que a plataforma e-lactancia deve ser usada como referencial inicial. Nesse caso, é importante observar:
A dose do medicamento (a plataforma analisa substâncias, mas não individualiza dose/peso).
A indicação real de uso.
A idade e condição de saúde do bebê.
Se existem alternativas mais seguras.
A plataforma e-lactancia deve ser usada como referencial inicial
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Em que casos não usar a plataforma?
Segundo Calsinski, as mães não devem usar a plataforma em situações como:
Critério único para suspender ou manter a amamentação.
Base para tomar medicamentos sem prescrição.
Substituta de consulta médica ou de avaliação profissional.
Avaliação de situações complexas (prematuros, bebês com cardiopatias, problemas metabólicos, mães com doenças crônicas).
Desafios da amamentação na era da desinformação
Moises Chencinski também menciona que é preciso ter cuidado com as informações disseminadas na internet com relação à amamentação. O aleitamento materno — que deve ser exclusivo até os seis meses — ainda enfrenta desafios para atingir a Agenda de 2025 e 2030, segundo dados da pesquisa da Alimentação e Nutrição Infantil no Brasil, o ENANI-2019. Por isso, qualquer informação imprecisa pode desestimular o aleitamento.
Chencinski chama a atenção para as baixas taxas apresentadas pela pesquisa:
62% dos recém-nascidos são amamentados na primeira hora de vida
A mediana de aleitamento materno exclusivo é de três meses
Menos de 50% dos lactentes são amamentados exclusivamente abaixo dos seis meses de idade.
“Ainda temos um longo caminho para que a amamentação seja normalizada e naturalizada em nosso país e para que todas as mães que assim o desejem tenham condições de fazê-lo”, destaca o especialista.
Para atingir as metas estabelecidas, o pediatra diz que é preciso evoluir em políticas públicas, nas redes de apoio, no ensino de aleitamento materno nas universidades de profissionais, que trabalham na área de saúde materno-infantil, além de considerar questões sociais, recortes raciais e culturais.
O principal desafio da amamentação costuma ser a desinformação, principalmente pelo excesso de conteúdos sem embasamento científico, o que traz desconforto e insegurança para as mães. “Infelizmente, esse material circula em grande velocidade pelas redes sociais, sem um filtro adequado, com repercussões danosas e prejuízos a toda a população, fazendo com que qualquer decisão tomada pela família não seja, necessariamente, a melhor ou a mais segura”, alerta Chencinski.
Ao considerar os tratamentos medicamentosos, o cenário é ainda mais sensível. “Muitas vezes, profissionais da área que não estudam e não conhecem adequadamente o funcionamento das substâncias contidas nos remédios, prescrevem, distribuem e vendem alguns produtos que, nem sempre, são seguros para os bebês que estão sendo amamentados”, ressalta o médico.
É preciso checar as informações em fontes confiáveis, como a publicação 'Amamentação e uso de medicamentos e outras substâncias', do Ministério da Saúde.
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Os documentos e plataformas com relação à compatibilidade da amamentação precisam também de uma interpretação mais cuidadosa, uma vez que nem todos os mecanismos estão atualizados constantemente com estudos recentes. Dessa forma, essas ferramentas podem trazer conceitos já modificados pelas novas pesquisas ou não apresentar novos medicamentos lançados.
Por isso, é preciso checar as informações em fontes confiáveis, como a publicação Amamentação e uso de medicamentos e outras substâncias, do Ministério da Saúde. A Sociedade Brasileira de Pediatria e suas regionais, por meio de seus Departamentos Científicos de Aleitamento Materno também publicam documentos sobre amamentação e medicamentos, assim como a Rede de Bancos de Leite Humano.
Na área médica, os especialistas também utilizam plataformas como LactMed (Drugas and Lactation Database), o Hales (HalesMeds.com e em livro também) e o já citado e-lactancia, que está disponível em inglês e espanhol.
“Cada um deles apresenta uma forma de se procurar a substância, fontes de pesquisa das mais variadas, análises de pontos diferentes, avaliações de riscos com formatos diferentes e que necessitam de um bom embasamento científico e conhecimento para a análise dos dados, antes de se tomar algum medicamento”, explica Chencinski.
No entanto, as famílias precisam ter cuidado, a automedicação não é recomendada. Assim, é importante realizar um acompanhamento desde a gestação, parto e pós-parto com os médicos que acolham e orientam as mães e famílias.
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